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quarta-feira, 30 de abril de 2008

Memória 30/04/1981- Atentado no Rio Centro


A pedido do poeta amigo Affonso Romano de Sant'Anna, reproduzo seu belíssimo poema, escrito como ele mesmo informa motivado pelo episódio do Rio Centro:


AMIGOS:

em tempos de " apropriação" e malversação da obra alheia, circula na internet e no youtube uma versão pobre e estropiada do poema meu A IMPLOSÃO DA MENTIRA, publicado originalmente durante a última ditadura militar. Peço aos amigos que contra ataquem em seus blogs, sites e toda forma eletrônica de comunicação divulgando essa verdade textual.

Em tempo: cuidado com os que dizem que a verdade não existe e que é arte qualquer coisa que qualquer um chama de arte. É mais uma mentira a ser ex/implodida.

Grato pela divulgação, ars

A Implosão da Mentira

Affonso Romano de Sant’ Anna



Fragmento 1

Mentiram-me.Mentiram-me ontem

e hoje mentem novamente.Mentem

de corpo e alma, completamente.

E mentem de maneira tão pungente

que acho que mentem sinceramente.

Mentem, sobretudo, impune/mente.

Não mentem tristes.Alegremente

mentem. Mentem tão nacional/mente

que acham que mentindo história afora

vão enganar a morte eterna/mente.

Mentem.Mentem e calam. Mas suas frases

falam. E desfilam de tal modo nuas

que mesmo um cego pode ver

a verdade em trapos pelas ruas.

Sei que a verdade é difícil

e para alguns é cara e escura.

Mas não se chega à verdade

pela mentira, nem à democracia

pela ditadura.



Fragmento 2

Evidente/mente a crer

nos que me mentem

uma flor nasceu em Hiroshima

e em Auschwitz havia um circo

permanente.

Mentem. Mentem caricatural-

mente.

Mentem como a careca

mente ao pente,

mentem como a dentadura

mente ao dente,

mentem como a carroça

à besta em frente,

mentem como a doença

ao doente,

mentem clara/mente

como o espelho transparente.

Mentem deslavadamente,

como nenhuma lavadeira mente

ao ver a nódoa sobre o linho.Mentem

com a cara limpa e nas mãos

o sangue quente. Mentem

ardente/mente como um doente

em seus instantes de febre. Mentem

fabulosa/mente como o caçador que quer passar

gato por lebre. E nessa trilha de mentiras

a caça é que caça o caçador

com a armadilha.

E assim cada qual

mente industrial? mente,

mente partidária? mente,

mente incivil? mente,

mente tropical?mente,

mente incontinente?mente,

mente hereditária?mente,

mente, mente, mente.

E de tanto mentir tão brava/mente

constróem um país

de mentira

-diária/mente.



Fragmento 3

Mentem no passado. E no presente

passam a mentira a limpo. E no futuro

mentem novamente.

Mentem fazendo o sol girar

em torno à terra medieval/mente.

Por isto, desta vez, não é Galileu

quem mente.

mas o tribunal que o julga

herege/mente.

Mentem como se Colombo partin-

do do Ocidente para o Oriente

pudesse descobrir de mentira

um continente.

Mentem desde cabral, em calmaria,

viajando pelo avesso, iludindo a corrente

em curso, transformando a história do país

num acidente de percurso.



Fragmento 4

Tanta mentira assim industriada

me faz partir para o deserto

penitente/mente, ou me exilar

com Mozart musical/mente em harpas

e oboés, como um solista vegetal

que absorve a vida indiferente.

Penso nos animais que nunca mentem.

mesmo se têm um caçador à sua frente.

Penso nos pássaros

cuja verdade do canto nos toca

matinalmente.

Penso nas flores

cuja verdade das cores escorre no mel

silvestremente.

Penso no sol que morre diariamente

jorrando luz, embora

tenha a noite pela frente.



Fragmento 5

Página branca onde escrevo. Único espaço

de verdade que me resta. Onde transcrevo

o arroubo, a esperança, e onde tarde

ou cedo deposito meu espanto e medo.

Para tanta mentira só mesmo um poema

explosivo-conotativo

onde o advérbio e o adjetivo não mentem

ao substantivo

e a rima rebenta a frase

numa explosão da verdade.

E a mentira repulsiva

se não explode pra fora

pra dentro explode

implosiva.


(Poema publicado no JB em 1984, quando do episódio do Rio Centro e em diversas antologias do autor. Está em “ Poesia Reunida” L&PM, v.2)




UM DOCUMENTO HISTÓRICO SOBRE O RIOCENTRO
.

(Eliakim Araújo- Direto da Redação)

Nesta quarta-feira, dia 30 de abril de 2008, o atentado ao Riocentro completou exatos 27 anos. Um tema que foi tabu durante muitos anos, porque envolvia militares do serviço de informação do exército num período em que a imprensa estava tolhida em sua liberdade de informar.

Hoje o atentado é de domínio público, está disponível em dezenas de páginas da internet e a mídia tem ampla liberdade de contar o que realmente aconteceu.

Em poucas palavras, o caso da bomba do Riocentro pode ser assim descrito. Naquele dia 30 de abril, um show comemorava o dia do trablho. Pouco antes das 10 da noite, o show foi interrompido pela explosão de duas bombas: uma no Puma, no estacionamento, e outra no prédio onde estava a casa de força do local. No Puma, estavam dois militares do serviço de informação do Exército, o capitão Wilson Machado, que ficou gravemente ferido e acabou sendo levado a um hospital por Andréa Neves, irmã de Aécio e neta de Tancredo, que apenas assistia ao show, e o sargento Guilherme Rosário, que morreu no local, com os intestinos à mostra, já que a bomba explodiu em seu colo.

A investigação ficou a cargo do Exército que indicou o coronel Luiz Antonio do Prado Ribeiro para chefiar o inquérito policial-militar. Duas semanas depois, entretanto, o coronel Ribeiro se afastou do cargo, alegando motivo de saúde.

Em maio de 2005, numa entrevista ao Fantástico, o Coronel Ribeiro contou emocionado que, à medida que recebia os laudos periciais e interrogava testemunhas, inclusive extra-oficialmente o capitão Wilson, ele começou a ter dúvidas e escreveu um documento "informando que, além dessa hipótese do atentado, poderia haver outra, essa outra, de uma ação ilegal dos serviços de informações”.

O Coronel Ribeiro ficou “doente”, por razões óbvias, e em seu lugar entrou o Coronel Job Lorena, cuja investigação concluiu que os militares tinham sido vítimas de um atentado terrorista.

Até aqui, nada de novo. O que quase ninguém sabe é que naquela noite de abril de 1981, uma equipe da TV Globo do Rio chegou ao local antes dos militares. A repórter Leila Cordeiro e o cinegrafista Mauricio tiveram tempo de filmar o carro e ouvir algumas pessoas antes que a área fosse totalmente evacuada.

Abaixo o depoimento de Leila Cordeiro sobre o que ela viu naquela noite e como a matéria foi tratada dentro da Globo:

O atentado no Riocentro

(Depoimento de Leila Cordeiro)


Há vinte e sete anos, no dia 30 de abril de 1981, tive a minha primeira grande experiência como jornalista. Eu trabalhava na Globo, sem horário fixo, já que estava começando. Era meio "pau pra toda obra" como todo iniciante. Ia onde me mandavam, sem hora pra começar e muito menos pra acabar. E foi assim que fui parar no Riocentro, na véspera do dia do trabalhador. Já havia terminado, oficialmente o meu horário como repórter, quando um telefonema da redação me convocou para estar a postos porque uma "kombi" da Globo iria me buscar para cobrir um "acontecimento inesperado" no estacionamento do Riocentro. Era tarde. Mais ou menos dez da noite. Já estava deitada, pronta pra dormir. Pulei rápido da cama e ainda sonolenta vesti-me com a primeira roupa que encontrei, até porque o carro da Globo chegou em seguida ao telefonema. Quando estacionamos no Riocentro senti algo estranho no ar, apesar de não ver nenhuma movimentação. Vimos que havia fumaça num determinado lugar do estacionamento e fomos até lá. Quando chegamos ao local, vimos em primeira mão, um carro esportivo "Puma" destruído com uma pessoa lá dentro também completamente destroçada.Era sangue por todo lado. O cinegrafista e eu não entendemos nada. Não sabíamos sequer porque estávamos ali. Aliás, naquele momento ninguém sabia. Nem a chefia de reportagem da Globo. Mas isso logo se resolveu. Em poucos minutos carros oficiais da polícia , do exército e dos bombeiros chegaram cercando toda a área. Nos empurraram para fora e começaram a perguntar o que tínhamos visto. Logo em seguida chegaram repórteres de vários jornais e cada um correu para o seu lado para apurar os acontecimentos. Naquele dia, eu sabia que estava aprendendo algo mais... Fiquei cobrindo o fato até o dia seguinte quando chegou outra equipe de reportagem para me render. Dali fui direto para a redação da Globo, onde fiquei à disposição dos editores e da direção para escrever o texto e ajudar na edição. Não vi e não posso afirmar, mas soube que representantes do alto escalão do exército estiveram nos andares poderosos do Jardim Botânico para acompanhar as informações. O que posso dizer é que tive que mudar o texto umas três vezes e quase "testemunhar"o que vi no estacionamento.


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25 de Abril de 1974- Censura 'Tanto Mar" Chico Buarque
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A negritude dos europeus

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Biografia da Rainha Nzinga
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por Drauzio Varella

Novas pesquisas genéticas estimam que a cor branca apareceu na Europa entre 6 mil e 12 mil anos atrás

Veja na edição impressa de Carta na Escola: estudos mostram que a cor da pele não difere os indivíduos geneticamente, apenas indica uma adaptação sofrida por ancestrais, explica bióloga.

Nossos ancestrais europeus foram negros durante dezenas de milhares de anos. Essa hipótese foi formulada 30 anos atrás por um dos maiores geneticistas do século XX, Luca Cavalli-Sforza, depois de conduzir estudos genéticos em centenas de grupos étnicos ao redor do mundo.
Para enunciá-la, Cavalli-Sforza partiu de evidências genéticas e paleontológicas sugestivas de que nossos ancestrais devem ter chegado ao Norte da Europa há cerca de 40 mil anos, depois de passar 5 milhões de anos no berço africano.

Esses primeiros imigrantes eram nômades, caçadores, coletores, pescadores e pastores que se alimentavam predominantemente de carne. Dessa fonte, os primeiros europeus absorviam a vitamina D, imprescindível para a absorção de cálcio no intestino e a boa formação dos ossos.

Nos últimos 6 mil anos, quando a agricultura se disseminou pelo continente, fixou o homem à terra e criou a possibilidade de estocar alimentos, a dieta européia sofreu mudanças radicais. A adoção de uma dieta mais vegetariana trouxe vantagens nutricionais, menor dependência da imprevisibilidade da caça e da pesca, aumentou a probabilidade de sobrevivência da prole, mas reduziu o acesso às fontes naturais de vitamina D.

Para garantir que o metabolismo de cálcio continuasse a suprir as exigências do esqueleto, surgiu a necessidade de produzir vitamina D por meio de um mecanismo alternativo: a síntese na pele mediada pela absorção das radiações ultravioleta da luz solar.

De um lado, a pele negra incapaz de absorver os raios ultravioleta na intensidade que o faz a pele branca; de outro, as baixas temperaturas características do Norte da Europa, que obrigaram os recém-saídos da África tropical a usar roupas que deixavam expostas apenas as mãos e o rosto, criaram forças seletivas para privilegiar mulheres e homens de pele mais clara.

Num mundo de gente agasalhada dos pés à cabeça, iluminado por raios solares anêmicos, levaram vantagem na seleção natural os europeus portadores de genes que lhes conferiam concentrações mais baixas de melanina na pele.

As previsões de Cavalli-Sforza enunciadas numa época em que a genética não dispunha das ferramentas atuais, acabam de ser confirmadas por uma série de pesquisas.

No ano passado, ocorreu o maior avanço nessa área: a descoberta de que um gene, batizado de SLC24A5, talvez fosse o responsável pelo aparecimento da pele branca dos europeus, mas não dos asiáticos.

Em outubro de 2005, o grupo de Keith Cheng, da Pennsylvania State University, publicou na revista Science um estudo demonstrando que existem duas variantes desse gene (dois alelos). Dos 120 europeus estudados, 98% apresentavam um dos alelos, enquanto o outro alelo estava presente em praticamente todos os africanos e asiáticos avaliados.

Trabalhos posteriores procuraram elucidar em que época essa mutação genética teria emergido entre os europeus.

Com emprego de técnicas de seqüenciamento de DNA, o gene SLC24A5 foi pesquisado em 41 europeus, africanos, asiáticos e indígenas americanos.

Pelo cálculo do número e da periodicidade com que ocorrem as mutações, os autores determinaram que os alelos responsáveis pelo clareamento da pele foram fixados nas populações européias há 18 mil anos.

No entanto, como a margem de erro nessas estimativas é grande, os autores também seqüenciaram outros genes localizados em áreas próximas do genoma. Esse refinamento da técnica permitiu estimar o aparecimento da cor branca da pele européia num período que vai de 6 mil a 12 mil anos.

Esses estudos têm duas implicações:
1) Demonstram que as estimativas de que os seres humanos modernos teriam aparecido há 45 mil anos e que não teriam mudado desde então estão ultrapassadas. Nossa espécie está em constante evolução.

2) Demonstram como são ridículas as teorias que atribuem superioridade à raça branca. De 5 milhões de anos, quando os primeiros hominídeos desceram das árvores nas savanas da África, a meros 6 mil a 12 mil anos, éramos todos negros.

DOSSIÊ Bolívia: raça e classe podem dividir o país no referendo de 04 de maio

Leia neste blog outras postagens relacionadas à história da América Latina:
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O Brasil e a questão da latinidade
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Ferrez analisa estereótipos sobre latinos e negros no cinema
Vitória de Lugo no Paraguai
Informação resiste ao choque
Fome mundial, latifúndios, deserto verde e biocombustíveis
Memória e história: ditadura militar
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Farcs

Raramente vemos imagens positivas como esta do presidente indígena da Bolívia Evo Morales, filho de pai Aymara e mãe quechua. De modo geral a imprensa nacional, estrangeira e até mesmo boliviano o representa como um 'populista' caricato e não raramente com cores preconceituosas em referência ao seu pertencimento étnico.

O que de fato sabemos sobre a história de vida e política desse presidente indígena em um dos países mais pobres da América Latina apesar da riqueza do gás natural para além dos estereótipos reproduzidos na imprensa e em alguns livros didáticos?

Para começar este dossiê, reproduzo dois vídeos de representações sobre o mesmo presidente profundamente diferentes.

O primeiro de um olhar estrangeiro e pró-estadunidense do jornalista espanhol Jorge Ramos que mostra um Evo Morales autoritário, defensor da coca e representante de outros defeitos inomináveis. Embora Evo enfrente algumas das perguntas com bastante segurança e propriedade, é impressionante ver como certos jornalistas têm uma visão pré-concebida sobre seus entrevistados, sobre a cultura que representam, independente do quanto seus prejulgamentos sejam reflexos da realidade ou não.

Do blog partidário da união boliviana reproduzo um vídeo que é uma voz dissonante nas representações que costumeiramente vemos por aqui. O vídeo conta um pouco da vida do presidente indígena que nasceu
na estância Isayavi, no povoado Orinoca, departamento de Oruro, pobre como os muitos presentes na Bolívia, sem água potável, sem eletricidade, sem assistência médica:


Infelizmente a imprensa corporativa brasileira dá pouquíssima atenção para o que ocorre nos países pobres latino-americanos e temos grandes dificuldades para entender questões centrais de nossos vizinhos da América Latina.


Na Bolívia da atualidade não apenas questões classistas, mas também o preconceito étnico e racial impulsionam uma minoria branca com apoio de uma parcela cabocla a reagir de forma violenta e ilegal às reformas sociais de Evo Morales, especialmente, à reforma agrária com a criação de assentamentos indígenas.


No próximo domingo dia 04/05/2008, o departamento de Santa Cruz de modo ilegal, pois o referendo passa por cima da Constituição boliviana, sem o reconhecimento do Mercosul ou da União Européia, mas com apoio de agências estadunidenses como a USAID (com longa história de intervenção imperialista e promoção de golpes em países latino-americanos) e sob a coordenação de uma elite econômica com práticas e discursos racistas tentará se separar do restante da Bolívia.


Reproduzo um dossiê elaborado a partir da seleção de artigos de opinião de jornalistas e blogueiros da mídia independente, de matérias, reportagens televisivas e um documentário publicados em outros países latino-americanos sobre a questão separatista boliviana para auxiliar os professores a avaliar esse conflito
profundamente polarizado e discuti-lo em sala de aula.

Na Bolívia 'se joga o futuro'
(Luiz Carlos Azenha)

WASHINGTON - A situação na Bolívia está ficando cada vez mais polarizada. No próximo domingo vai realizar-se o referendo que trata da autonomia do departamento de Santa Cruz, o mais rico do país. Não se trata, apenas, da fratura entre ricos e pobres. É o rompimento da planície com o planalto, da elite branca e mestiça com os índigenas do altiplano, do projeto político dos grandes industriais e latifundiários com o do indígena que pretende representar os movimentos sociais.

Philip Goldberg, o embaixador dos Estados Unidos em La Paz, foi o chefe da missão americana em Pristina, Kosovo, entre 2004 e 2006. Tem experiência na partilha de países. Através da Agência dos Estados Unidos para o Desenvolvimento Internacional (USAID) e do National Endownment for Democracy (NED) Washington financia grupos da "sociedade civil" bolivianos, alguns deles voltados para a resolução de conflitos.

O governo de Evo Morales demoniza o embaixador, a quem acusa de interferir nos assuntos internos da Bolívia e a quem pediu que se posicionasse publicamente em relação à autonomia de Santa Cruz. O embaixador respondeu que cabia aos bolivianos decidir. Os Estados Unidos apontam para a Bolívia como um exemplo da interferência indevida da Venezuela na vizinhança.

Os dois países têm as grandes reservas de petróleo e gás natural do continente.

Nem o Mercosul, nem a União Européia vão reconhecer o resultado do referendo do próximo domingo - que era a pretensão dos líderes de Santa Cruz.

Os "poncho rojos", um grupo de apoio a Evo Morales, anunciaram a formação de um exército indígena para defender a unidade da Bolívia.
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NA BOLÍVIA SE JOGA O FUTURO

por Luis Bilbao, na Bolpress (tradução- Luiz Carlos Azenha)

Toda pessoa consciente deveria preocupar-se com o que ocorre na Bolívia. Os Estados Unidos estão a ponto de deflagrar ali uma guerra que sacudiria a região e que logo levaria um estado de comoção e beligerância a toda a América do Sul.

A desculpa é a autonomia de quatro departamentos (Santa Cruz, Beni, Pando e Tarija); o instrumento, a oligarquia; a mídia, corpo mercenário financiado, treinado e comandado pelo Departamento de Estado através da CIA e outras agências; o objetivo, fragmentar a Bolívia, deter o processo revolucionário encabeçado por Evo Morales, introduzir uma cunha de fogo no Cone Sul e criar as condições para atacar a Venezuela e o Equador. Desde domingo passado, o Paraguai também está ameaçado. Os Estados Unidos necessitam a guerra.

A economia capitalista já não pode respirar sem ela. Eram os que crêem que o pântano do Iraque impede outras fontes de combate. É o inverso: só resta a eles seguir adiante. Mas buscam fazê-lo na diagonal, espelhando a linha de ação no Oriente Médio: abrir fissuras objetivas nas formações econômicas, sociais, étnicas e religiosas; aguçar conflitos latentes; desatar a guerra entre facções, colocar-se acima delas e cavalgar sobre a destruição mútua dos povos.

A diferença com aquela zona devastada pela invasão, as lutas intestinas e o constante alimento da guerra (os candidatos a suceder George W. Bush já anunciaram sua disposição de "arrasar o Irã"), é que na América Latina existe um germe de um centro político continental.

Os governos de Cuba, Venezuela, Nicarágua e Bolívia assumiram a necessidade de enfrentar o imperialismo nas condições do mundo contemporâneo, ou seja, atacando a raiz do capitalismo. A reunião de emergência realizado na madrugada do último dia 23 por Hugo Chávez, Evo Morales, Daniel Ortega e Carlos Lage como representante de Raúl Castro, e as decisões adotadas nela, são indicativas de que esse bloco começa a atuar como direção política internacional.

Mas não é o suficiente. Os partidos e organizações com os que contam estes quatro governos são a vanguarda revolucionária do continente, mas não alcançam reunir o conjunto do ativo de trabalhadores, camponeses, jovens e dos povos desde o rio Bravo até a Patagônia. Essa é uma tarefa pendente.

A única via para atingí-la é que essas vanguardas, em toda a sua diversidade, encontrem o caminho das grandes maiorias e consigam explicar e persuadir a milhões do que está ao mesmo tempo claro mas às vezes tão obscuro: o imperialismo e as oligarquias que se subordinam a ele e as posições dos que vacilam em plantar-se diante da Casa Branca estão nos levando ao abismo da guerra.

É preciso detê-los. É preciso somar vontades, no mais amplo espectro possível, a partir da simples compreensão da ameaça. Não se poderá impedir a violência pedindo a Evo, como faz a OEA, que negocie com os cães de guerra atiçados por Washington. Trata-se de defender incondicionalmente ao legítimo governo indígena da Bolívia. E por todos os meios necessários.

Urge convocar reuniões em cada cidade da América Latina para explicar e debater esta conjuntura dramática. Dessas milhares de assembléia deverão surgir ações de mobilização e formas de união nacional e regional. E estar prontos para enviar delegações a La Paz, fazer atos, concertos, encontros de todo tipo, em todas as partes, com todos e todas que entendam a gravidade do momento e com o único objetivo de amarrar as mãos assassinas do imperialismo.

*Luis Bilbao é diretor do América XXI

Do Blog do Mello reproduzo os artigos e vídeos a seguir:

Documentos comprovam envolvimento dos EUA na tentativa de desestabilização da Bolívia

Veja esta entrevista em que a advogada venezuelana-americana Eva Gollinger denuncia, no programa La Hojilla, da emissora venezuelana VTV, o envolvimento direto dos Estados Unidos na vida política boliviana, com o objetivo de fomentar movimentos oposicionistas ao governo de Evo Morales.

Gollinger exibe documentos oficiais do governo americano que comprovam a remessa de milhões de dólares para o patrocínio de movimentos separatistas e golpistas da chamada Media Luna boliviana.

Na entrevista, a advogada apresenta um dossiê sobre o embaixador americano, Philip Goldberd, que serviu como embaixador no episódio separatista do Kosovo, e assumiu o cargo na Bolívia logo após a posse de Evo Morales.

Entre os documentos apresentados por ela há um que mostra que o governo americano paga a jornalistas para escreverem matérias e artigos favoráveis às diretrizes traçadas por Washington.

Nada disso é novidade. É a mesma estratégia aplicada em outros países, desde o Chile de Allende, em 1973, passando pela Venezuela e agora a Bolívia.

Fico pensando quando teremos uma Eva Gollinger brasileira, que denuncie o esquema no Brasil e aponte jornalistas que recebem para desestabilizar o governo Lula.

Leia e veja também:

» Assista ‘Guerreros del Arcoiris’: Documentário mostra preparação de golpe de Estado na Bolívia


Não deixe de assistir a este documentário, Guerreros del Arcoiris, que foi exibido pela primeira vez na noite de ontem, sábado, 26 de abril, às 22h30 de Brasília, pelo canal Vive TV, da Venezuela.

Assistindo-o, você vai ter um panorama geral do que está acontecendo neste momento na Bolívia, onde um grupo separatista, racista e violento, patrocinado pelos Estados Unidos, quer declarar sua independência da Bolívia, dividindo o país para não ter que compartilhá-lo com os demais povos que formam a nação boliviana.

Logo após a eleição de Evo Morales, os Estados Unidos deslocaram para a Bolívia seu embaixador que estava na Sérvia, portanto, um especialista em fomentar ambições separatistas.

O documentário mostra como os EUA investem milhões de dólares patrocinando movimentos separatistas da chamada Media Luna, que reúne quatro departamentos da Bolívia, entre eles o de Santa Cruz, que agora, no próximo dia 4 de maio, vai votar um referendo ilegal, convocado à margem do Estado Boliviano, pela aprovação de sua autonomia.

Já falei dos “cruceños” aqui. Nos links abaixo você pai poder ver, ou rever, a agressão covarde que praticam contra um homem desarmado e indefeso e como não se deram nem ao trabalho de criar um estatuto próprio, copiando o da Catalunha.

Ao referendo do próximo dia 4, nem a OEA, nem a Comunidade Européia, nem a ONU enviarão representantes, porque reconhecem sua ilegalidade. Apenas um país vai apoiar e respaldar o referendo, os Estados Unidos.

Há um golpe em marcha na Bolívia, com data marcada. É isso o que mostra Guerreros del Arcoiris.

»Vídeo: Racistas bolivianos agridem covardemente um ‘índio de mierda’

» Golpistas bolivianos plagiam projeto de Estatuto da Catalunha

» Racistas bolivianos agridem camponeses

» Dois anos de governo Evo Morales. O que você nunca leu

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Do blog do jornalista Pedro Ayres (Crônicas e Críticas da América Latina), especializado em discutir as questões latino-americanas, reproduzo textos e vídeo seguintes:

Imprensa e Justiça debatem o ilegal referendo

O jornalista Remberto Cárdenas, presidente da Confederação dos Trabalhadores da Imprensa da Bolívia e Wilfredo Chávez, Viceministro da Justiça e Direitos da República da Bolívia, ontem, no programa nacional, Cabildeo, debateram a situação do País e os problemas que podem advir com o ostensivo comportamento sedicioso dos departamentos da Meia Lua. Este é o sentido do presente vídeo.


Separatistas não querem nenhum diálogo
(Terça-feira, 29 de Abril de 2008)


Dante Caputo, diplomata argentino e Secretário para Assuntos Políticos da OEA, à espera de uma reunião que não houve


Diálogo de Prefectos y Gobierno con Caputo quedó postergado

La reunión que se tenía prevista para las primeras horas de la mañana entre el presidente de la república y el representante de la Organización de los Estados Americanos (OEA), Dante Caputo, se postergó de manera obligatoria. Así mismo, el secretario de la OEA, le reclamó al prefecto de Santa Cruz, Rubén Costas, porque no hubo ningún acuerdo preciso, es decir sin fecha fija para entablar una reunión entre el Gobierno y los Prefectos de la denominada ‘media luna ampliada’, además, declaró que la autoridad departamental no le quiso contestar el teléfono, para coordinar un posible encuentro en la capital cruceña.

Al respecto, el secretario general de la Prefectura, Rolando Aguilera, le explicó al representante de la OEA que el prefecto de Santa Cruz no podía contestarle sus llamadas, puesto que se encontraba en una zona donde la señal no alcanza, siendo estas las localidades de Cuevo y Boyuibe, provincia Cordillera.

La participación de Caputo en Bolivia, es con la intención de acercar al Gobierno del presidente Evo Morales y los prefectos de Santa Cruz y otros departamentos, en la disputa política que amenaza con la supuesta división del país, el mismo que conllevará a enfrentamientos en el proceso electoral convocado para este domingo 4 de mayo. El secretario general de la OEA, José Miguel Insulza, encomendó a Caputo que viaje de nuevo a Bolivia para intentar un acercamiento entre ambas partes. Así mismo, Insulza reclamó que se encuentra insatisfecho con las declaraciones del prefecto Costas, en torno al fracaso del diálogo.

Los prefectos de la denominada media luna ampliada, enviaron una carta a la OEA con la intención de realizar un encuentro con el Gobierno, pero el organismo internacional, cuestionó que en la misiva no existía fecha fija para el diálogo, esta acción fue criticada por los gobernantes, los mismos que también realizaron el mismo pedido a la OEA para que busque una mesa de diálogo con la oposición, en los días previos al Referéndum del 4 de mayo, donde varios departamentos liderados por Santa Cruz deciden dejar el centralismo.



Quiroga no cree en la participación de la OEA por falta de neutralidad

El jefe nacional de Poder Democrático y Social (Podemos), Jorge ‘Tuto’ Quiroga, señaló que el establecimiento de un diálogo entre el Gobierno y la oposición para superar la actual crisis política que atraviesa el país será posible con la mediación de la Iglesia Católica y con el acompañamiento de países amigos, como son Argentina, Brasil Colombia y México.

"Diálogo con la mediación de la Iglesia y con el acompañamiento de los países amigos, Unión Europea, gente neutra, confiable y creíble que no estén bajo la influencia del rey del ALBA, el señor Chávez", señaló ‘Tuto’.

Por otro lado, el jefe de Podemos dijo que el informe de la Organización de Estados Americanos (OEA) respecto a la situación política en Bolivia no merece ninguna confianza por su falta de neutralidad y credibilidad.

"El Secretario General y la misión que envía con el señor Enrique Correa, que es el operador político chileno del señor Insulza, que es el que redacta los informes, no nos merece ninguna confianza; es hasta una falta de tacto y de sensibilidad… el señor Insulza, que se auto descalificó por su paralización y falta de neutralidad y credibilidad… nos llenan de insultos y de injurias y la OEA no dice nada ni ha dicho sobre las violaciones al Tribunal Constitucional, ataques a medios de comunicación, cómo se ha golpeado a diputadas, cómo se ha acuartelado la Asamblea, cómo se la ha llevado a la UTO en Oruro para causar hechos de violencia", resaltó el jefe de Podemos.

Bolivia denunciará ante comunidad internacional plan de limpieza étnica en Santa Cruz

El Gobierno boliviano denunciará a la comunidad internacional el plan de "limpieza étnica" que la Unión Juvenil Cruceñista amenazó con aplicar luego del 4 de mayo en cumplimiento del proyecto de estatuto autonómico.

Así lo indicó este martes el director General de Justicia Comunitaria, Petronilo Flores, quien dijo que "el plan de limpieza étnica es sinónimo de discriminación y racismo contra los residentes paceños, orureños, potosinos y de todo el occidente en Santa Cruz".

Apuntó que desde el Viceministerio de Justicia Comunitaria impulsarán una denuncia formal ante las Naciones Unidas (ONU), la Organización de Estados Americanos (OEA), el Alto Comisionado de los Derechos Humanos sobre las formas de discriminación a partir del estatuto autonómico ilegal e inconstitucional que intenta ser legitimado el 4 de mayo por la oposición derechista al Gobierno de Evo Morales.

Lamentó que uno de los artículos del proyecto de estatuto señala que "el pueblo cruceño es racialmente mayoritaria y mestiza", en una franca actitud racista en pleno siglo XXI, indicó la Agencia Boliviana de Información (Abi).

Según Flores, a partir de esta expresión o de la redacción de las formas de discriminación, la Unión Juvenil Cruceñista, grupo de choque del Comité Cívico, está hoy en la tarea de intimidar, amedrentar con la amenaza de que después del 4 de mayo se iniciará la llamada "limpieza étnica".

Flores manifestó que no es posible que en pleno siglo XXI "estemos viviendo estas formas de discriminación racial, donde hay principios constitucionales, democráticos y las personas son iguales".

*************

Do blog do Eduardo Guimarães reproduzo o texto abaixo:

BOLÍVIA: A batalha da 'Media Luna"

No próximo dia 17, farei nova viagem ao exterior, depois da impressionante experiência que tive em Angola durante o mês de fevereiro deste ano, quando conheci uma realidade que chega a parecer fictícia em pleno século XXI. Meu próximo destino é a Bolívia, país que, apesar da omissão da mídia brasileira, que pouco ou nada vem noticiando sobre ele, está atravessando uma crise política e institucional extremamente grave.

No próximo domingo, dia 4 de maio, será realizado um plebiscito convocado pelo governo de Santa Cruz de la Sierra. A consulta popular será realizada à revelia do governo central da Bolívia, presidido pelo índio Evo Morales, e constitui, a rigor, uma proposta separatista engendrada pela oposição boliviana.

Especula-se que pode haver violência, pois a convocação do plebiscito e seu teor são inconstitucionais, constituindo um verdadeiro ato de sedição. É como se Rio, São Paulo, Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul pretendessem se separar do Norte, do Nordeste e do Centro-Oeste do Brasil. No entanto, a mídia brasileira praticamente ignora a possibilidade de um grave confronto no país vizinho, a possibilidade de haver uma guerra civil na região boliviana conhecida como "Media Luna".

Como conhecedor da realidade boliviana, cumpre-me suprir a carência do noticiário nacional escrevendo este texto. O que você lerá a seguir sobre a realidade política, social e institucional da Bolívia, não me foi contado por ninguém, é fruto de constatações que fiz nas viagens de negócios que venho empreendendo àquele país - pelo menos duas por ano - desde 1996.

A elite, a mídia e o grande empresariado bolivianos estão tentando reproduzir o que seus congêneres venezuelanos vêm fazendo há anos na Venezuela, ou seja, estão tentando derrubar ou, na melhor das hipóteses, paralisar um governo democraticamente eleito e que apenas tenta pôr fim à miséria de dar dó em que vivem índios que constituem a quase totalidade da população boliviana.

Eis, a seguir, os fatos sobre a Bolívia que é preciso conhecer para bem entender sua realidade política, social, econômica e institucional.

A Bolívia é o país mais pobre da América do Sul. Os índios quéchuas, aymarás e outros, mais uma boa parcela de mestiços, constituem cerca de 90% da população. Destes, outros 90% vivem, em grande parte, na pobreza, e a maior parte, na miséria. Um contingente expressivo dos índios bolivianos ganha cerca de um dólar por dia.

A maior parte dos índios não tem rede de esgoto, educação minimamente aceitável e padece de doenças que desapareceram na maioria dos países de civilização média.

A maioria indígena está concentrada em regiões contíguas à Cordilheira dos Andes, ou seja, La Paz, Sucre, Cochabamba, Oruro, Potosi.

Os habitantes indígenas das cidades do Altiplano (da Cordilheira) são conhecidos como “collas”, e os da planície, da região conhecida como “Media Luna” (constituída por Santa Cruz de la Sierra, Pando, Tarija e Beni), são conhecidos como “cambas”.

Há uma rivalidade crescente e explosiva entre “collas” e “cambas”. Eles se odeiam, ainda que muitos indígenas vivam na região da “Media Luna” segregados, sem direitos, oprimidos e odiados.

Os “cambas” dividem-se entre uma minoria branca e rica, majoritariamente descendente dos conquistadores espanhóis que não se miscigenaram com os quéchuas, aymarás e outros, e os índios (“collas”) submissos, que formam um enorme exército de serviçais dos ricos da região de Santa Cruz.

Os “cambas” índios e mestiços, em grande parte, votam e emulam os discursos de seus patrões, mas, muitas vezes, da boca para fora, como mostram os resultados das eleições mais recentes, nas quais os “cambas” índios e pobres dividiram-se no apoio a Evo Morales, perdendo por pouco para a elite.

A grande mídia boliviana da "Media Luna" é formada pelos grandes canais de TV e pelo principal jornal da direita branca e rica. São as TVs Unitel, do grupo agropecuário Monastérios, Red Uno, do grupo de supermercados Kuljis, Sitel, da cervejaria dos Fernandez, Pat, do grupo dos Daher (distribuidores Sony na Bolívia) e o jornal El Dia.

O fato é que a América Latina está submetida toda ao mesmo processo, no qual as elites dos países da região - todos transbordando de pobreza e desigualdade - tentam, valendo-se do controle que exercem sobre os meios de comunicação, impedir que as grandes massas mestiças, negras e índias, mantidas na ignorância, na pobreza extrema e vivendo em condições indignas, votem em causa própria, elegendo governos comprometidos com a promoção de distribuição de renda e de oportunidades.

O que vemos fazer a mídia brasileira não chega a um décimo do que fazem as mídias de países nos quais foram eleitos governos dispostos a enfrentar as elites e suas mídias com maior decisão. São países como Bolívia, Venezuela, Equador etc, os quais venho visitando há mais de uma década.

Porém, assim mesmo, posso garantir que o Brasil está trilhando o mesmo caminho que eles. Só que, devido a ser um país muito mais complexo e devido ao fato de que Lula parece ter optado por uma transformação mais lenta e contemporizadora, a mídia brasileira, por incrível que possa parecer, porta-se com maior comedimento do que suas congêneres de outros países latino-americanos.

De volta à Bolívia. Quem chega a Santa Cruz e começa a assistir as grandes TVs locais, chega a ficar com medo. Nos programas em que os brancos ricos vertem sua baba reacionária contra Evo Morales, só se fala em “guerra civil”, “desobediência civil” e “autonomia”. O discurso que predomina na mídia dos “cambas” brancos e ricos dá a impressão de que o que ocorreu na Venezuela, por exemplo, ocorrerá na Bolívia em pouco tempo. O ódio da elite “cruceña”, no entanto, não nasceu com a chegada do índio Evo Morales ao poder.

Os “cambas” brancos e ricos – que não passam de um punhado que não dá dez por cento dos bolivianos – odeiam os “collas” desde sempre. Horrorizam-se com seus trajes típicos – por exemplo, das mulheres gordinhas, baixinhas, de pele escura, que usam xales com motivos indígenas, saias compridas e rodadas e chapéus-coco -, com suas bocas desdentadas, com seus narizes aduncos... Enfim, gente “feia”, para os brancos ricos da região da rica “Media Luna”.

Os "cambas" horrorizam-se ao ver o ministério de Evo Morales, majoritariamente composto por “collas despreparados”, no dizer da elite. O ódio deles tem raízes racistas. A chegada de um dos objetos de sua execração ao poder apenas exacerbou um ódio que já existia, porém embebido em mero desprezo.

Mas há outros fatores para o ódio dos “cambas” brancos e ricos. Como alguns já devem ter adivinhado, é o dinheiro.
Evo seguiu o exemplo de Hugo Chávez, que passou a canalizar o dinheiro do petróleo que abunda em seu país para lograr feitos como extinguir o analfabetismo na Venezuela depois de décadas em que a elite branca de lá chegava a usar esse dinheiro até para importar água mineral de Miami, ou o exemplo de Lula, que despertou o ódio da elite brasileira ao adotar medidas que estão levando negros e índios às universidades e permitindo que famílias pobres se alimentem, vistam-se e vivam melhor graças a programas como o Bolsa Família.

A elite boliviana já fez um plebiscito em dezembro de 2006 tentando uma certa “autonomia departamental”, que pedia autonomia econômica e administrativa de cada um dos nove Estados do país. Esse referendo foi proposto pelo presidente anterior a Morales, Carlos Mesa. A tal “autonomia” visava manter em Santa Cruz os recursos que Evo vem “torrando” com os “collas” em programas sociais. Os "collas" que, diga-se de passagem, somam, "apenas", três quartos da população da Bolívia.

O resultado do primeiro plebiscito sobre "autonomia departamental", que foi realizado em toda Bolívia em dezembro de 2006, foi o de que a “autonomia” perdeu no cômputo geral dos votos da maioria dos bolivianos, mas venceu nas regiões da “Media Luna”.

No ano passado, a Bolívia instituiu uma Assembléia Nacional Constituinte na capital do país, que, ao contrário do que se pensa, não é La Paz e, sim, Sucre. La Paz é apenas a sede do governo boliviano. Essa assembléia tratou da questão da autonomia derrotada em plebiscito no ano anterior, coibindo absurdos como o de permitir que cada departamento (estado) tivesse uma espécie de “ministério de relações exteriores”.
Os “cambas” brancos e ricos da região da "Media Luna" não aceitaram o resultado do plebiscito de dezembro de 2006 nem a regulamentação da "autonomia departamental" pela assembléia constituinte.. Começaram a falar, ensandecidos, em “guerra civil” e em “desobediência civil”, o que seja, os governos da “Media Luna” não repassarem impostos ao governo central e desobedecerem suas determinações.
Para que se tenha uma idéia do surto alucinado que tomou conta dessa gente, os insurrectos da "Media Luna" chegaram a ir aos EUA para tentar falar com George Bush. Obviamente que não foram recebidos, pois não representavam o estado boliviano. Depois, foram à ONU, e também deram com a cara na porta. Contudo, o governo de Evo Morales diz que o embaixador americano na Bolívia tem se envolvido em conversas com os golpistas "cruceños" e que dinheiro americano tem aportado nos cofres da oposição.

A tal “guerra civil” que pretendem os “cambas” brancos e ricos, no entanto, não passa de balela. A elite da "Media Luna" é amplamente minoritária.
Aliás, se conseguissem provocar a tal guerra civil, seriam trucidados. As forças armadas bolivianas são compostas, obviamente, pelos odiados “collas” e não estão nem aí para os chiliques das madames “cambas”, como as que se congregaram em grupos parecidos com o do natimorto movimento "Cansei", no Brasil. O "Cansei" boliviano se intitulou com nomes heróicos como “Mujeres de Septiembre”, que, a exemplo de seu congênere brasileiro, realizou manifestações de meia dúzia de gatos pingados contra o governo.

Quando eu chegar à conflagrada região da "Media Luna" no próximo dia 17, o plebiscito do próximo domingo já terá ocorrido e a Bolívia estará vivendo seus efeitos. Existe até a possibilidade de ter que adiar essa viagem, caso a situação política se agrave por lá.
Espero, no entanto, que o bom senso prevaleça, apesar de que conheço muito bem a realidade daquele país e sei que a elite boliviana, tal como a venezuelana, a argentina ou a brasileira, entre outras, não conhece limites em sua irracionalidade egoísta e golpista.

Quando a guerra a fome o luxo e o consumismo se encontram

A artista plástica dinamarquesa Nadia Plesler teve uma idéia excelente, usar a sua criatividade, explorando símbolos de consumo para criar um campanha de combate aos horrores da fome e da guerra em Darfur, um dos maiores campos de refugiados do planeta.

Observe as contradições que ela aponta na arte criada em camisetas e posters cuja renda das vendas é revertida para a população de Darfur:
Uma criança acuada, subnutrida, desprotegida e desnuda que carrega os símbolos de consumo identitário das 'patricinhas' de Nova York e de Bervely Hills, cuja personalidade mais representativa é a socialite e atriz Paris Hilton. Trata-se da escandalosamente cara bolsa da marca francesa Louis Vuitton e o cachorrinho chihuahua de aparência duvidosa como o Tinkerbell de Paris Hilton.

O nome da campanha Simple living (vida simples) também alude a um programa do estilo reality show, protagonizado por Paris Hilton, o modelo mais bem acabado do consumismo como identidade pessoal.

Plesler não é a primeira artista a se incomodar com o fato de cerca de 2.500.000 de pessoas terem de viver refugiadas e cerca de 400.000 terem sido vitimadas pelo conflito e as péssimas condições de vida nos campos de refugiados.

O músico Brian Shaheen no ano passado fez um concerto no Carnegie Hall 'Requiem for Darfur' e reverteu a renda para as campanhas humanitárias que prestam socorro à região.



Das dezenas de vídeos que encontrei no youtube sobre a questão, selecionei Darfur: A Modern Day Genocide pelo fato de que ele foi feito por uma adolescente canadense de 15 anos, idade aproximada de nossos alunos na 8ª série/9º ano.

Ao final de seu contundente curta ela dá um depoimento sobre o que a motivou a fazer esse filme: insatisfeita com a falta de ação, de atitude em relação ao genocídio que ocorre na região sudanesa de Darfur, ela espera que ações como as de pessoas jovens como ela façam a diferença para aumentar a sensibilização no mundo adulto - lideranças mundiais e a sociedade civil planetária - para que ajam e ponham fim ao conflito e ao sofrimento de milhões de pessoas.

Voltemos à artista dinamarquesa Plesler e a marca francesa Louis Vuitton: a primeira está sendo processada pela Louis Vuitton por 'por infringir os direitos de propriedade intelectual da grife'.

Dada a recusa de Plesler de retirar de suas camisetas e cartazes a referência à bolsa da marca francesa, se a artista perder o processo terá de arcar com: 'cinco mil euros a cada novo dia de venda de produtos, mais cinco mil euros a cada dia que a carta de Plesrer permanecer publicada no site e outros cinco mil euros a cada dia que o site usar a palavra 'Louis Vuitton'.

A resposta de Plesler a Louis Vuitton é bastante ilustrativa de sua crítica ao consumismo desumano e a incapacidade de uma elite global olhar para os seus semelhantes. Segundo ela a ilustração foi inspirada pela constante cobertura na imprensa de "coisas sem sentido". "Já que não fazer nada, fora usar bolsas de grife e pequenos cachorros feios é suficiente para colocar gente em capas de revistas, então vale uma tentativa para aqueles que realmente precisam de atenção". Leia mais em Nadia Plesler


A artista franco-brasileira Marie Ange Bordas conviveu durante três anos com refugiados em Johannesburg (África do Sul) e no Campo de Refugiados de Kakuma (norte do Quênia). Por meio da realização de oficinas de fotografia, vídeo e som, do resgate de relatos orais e da criação de exposições dentro e fora das comunidades nasceu "Deslocamentos", um projeto artístico com e sobre pessoas vivendo a experiência de um deslocamento forçado.

O material que ela criou com as crianças e adultos destes também gigantescos campos de refugiados entre fotografias, vídeos, esculturas e outras instalações já circulou o país em uma das exposições mais contundentes que pude ver. Deslocamentos ao mesmo tempo em que mostra as viagens forçadas de populações inteiras premidas pelas guerras, fome e concentração de renda e terras, desloca a nós mesmos de nosso comodismo diante dessas tragédias que não poupam sequer as crianças.

terça-feira, 29 de abril de 2008

As visões sobre educação e segurança pública podem ser positivas?

Analisando a pesquisa CNT/Census publicada ontem (28/04/2008), para além da crescente popularidade do atual presidente, chamaram-me a atenção as percepções do povo brasileiro sobre educação e segurança pública.

Se você parar para analisar os resultados da pesquisa (acesse-a aqui) sobre as variáveis Emprego, Renda, Saúde, Educação e Segurança Pública, perceberá que os entrevistados apontam que nos últimos 6 meses ocorreram mudanças positivas e perceptíveis em relação ao emprego e a renda. Em relação à Saúde creio que os focos de epidemia de dengue explicam o resultado da avaliação; quanto as variáveis Segurança Pública e Educação os entrevistados também não vêem melhoras expressivas.

Ao medir as expectativas da população em relação a melhoria das condições dessas variáveis para os próximos 6 meses o otimismo diminui (parece que o povo brasileiro está com 'o pé no chão', controlando suas expectativas), mas nenhuma delas é tão baixa como a relativa a variável EDUCAÇÃO.

À noite de ontem, assistindo ao psicanalista Contardo Calligaris no programa Roda Viva, na tevê Cultura, cujo tema era a análise do mundo e da vida contemporânea, o entrevistado foi provocado por um telespectador policial. Este lhe perguntou se a polícia que temos seria um reflexo de nossa sociedade.

Calligaris respondeu que não apenas a polícia, mas todas as instituições são, em alguma medida, reflexos das sociedades que as criaram e as mantêm. E, como psicanalista com uma rara visão antropológica e histórica de seu ofício, complementou: nossa polícia melhorará no dia em que ser policial for o sonho das crianças de classe média; no dia em que esta profissão fizer parte da expectativa de futuro das crianças desta camada social.

O dia em que uma criança dos Jardins (bairro de classe média alta da cidade de São Paulo) disser que quer ser policial e sua afirmação não for peremptoriamente ignorada, rejeitada ou até mesmo ridicularizada como 'brincadeira (de mau gosto) de criança', poderemos ver mudanças expressivas na escala de valores da elite brasileira, possivelmente jamais vistas em nossa história.

Eu diria que com a educação ocorrerá o mesmo.

A profissão de mestre de escola básica já foi valorizada como uma profissão profundamente respeitável para a formação cidadã, especialmente ao longo do século XIX e durante a primeira década do XX.

Durkheim chegou mesmo a nos definir como um ministério laico, verdadeiros sacerdotes leigos, responsáveis por educar moralmente e de modo laicizado o cidadão comprometido com a construção de uma sociedade democrática.

Depois da Primeira Guerra a crença no papel da educação como fundamental para a criação de uma sociedade de paz e progresso foi bastante abalada. Mas em países como o nosso (onde a escolarização em massa chegou mais tardiamente que nos países europeus), ainda na primeira metade do século XX, poderíamos constatar o status positivo da profissão docente. Éramos, igualmente, vistos como os responsáveis por retirar da 'ignorância' uma grande massa (em sua maioria rural) e que necessitava ser educada, 'civilizada' nos moldes da 'civilidade urbana'.

Hoje os educadores reconstituíram tais representações sobre o papel dos professores e, muito embora nossa identidade ainda esteja em construção, conseguimos enxergar os limites da educação sem, no entanto, abandonar a idéia de que nosso trabalho permanece como algo necessário e de grande importância nas sociedades contemporâneas, especialmente no que diz respeito à formação de valores socialmente desejáveis e de condutas pró-sociais.

Calligaris enxerga em nosso país duas representações da infância: 'as crianças-rei', filhas da classe média e média alta para as quais poucos limites são impostos e que raramente convivem com frustrações e as crianças 'dejetos', grosso modo, a expressão serve pra definir todas aquelas destituídas dos direitos básicos da infância.

Retomando à afirmação inicial de Calligaris sobre as instituições, sociedades e seus reflexos, creio que na atual crise da educação pública, ajudaria bastante se a classe média (que opta cada dia mais pelas instituições privadas* para educar seus filhos) se comprometesse (como cidadãos) com a melhoria do ensino público, assim como com a manutenção de seu caráter público e cobrasse do Estado, independente do partido que o governa, que não abra mão do seu papel como principal ator das diretrizes e gerenciamento do ensino no país.

Esse olhar cidadão da elite que tanta falta faz em nosso país, faria com que seus filhos um dia sonhassem em ser professores. Pode parecer assustador a alguns, especialmente àqueles movidos por um profundo individualismo que é capaz de cegá-los e de impedi-los de se comprometer com as principais questões nacionais que afetam a todos (incluindo aí as variáveis Educação, Saúde e Segurança Pública).

Mas na visão sistêmica defendida por Calligaris (e com a qual concordo), seria bom ver nossas crianças-rei que vivem de modo privilegiado sonharem em ser educadoras juntas com as 'crianças-dejeto' para que todos nós pudéssemos sonhar com uma sociedade capaz de se reinventar, reconstruir-se em novos moldes: sem crianças-rei nem 'crianças-dejeto', apenas crianças como todas poderiam e deveriam ser.
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*As boas escolas privadas que realmente educam e não apenas adestram seus alunos sabem e não negam o fato de que a educação nunca deixará de ser um bem público, embora o espaço escolar delas seja privado.