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segunda-feira, 3 de março de 2008

História agora: incursão militar colombiana nas fronteiras do Equador

Atualização 21/06/2008

Em 03/03/2008 trouxemos impressões diferentes sobre como a mídia abordava a questão do conflito entre Colômbia e Equador.
Atualizamos agora esta postagem com um artigo analítico sobre as relações entre Washington e a América Latina, acreditamos que vale a pena a leitura e reflexão, pois o texto é produzido por um jornalista estadunidense e traz algumas críticas bastantes ausentes em nossa mídia.
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A distância entre a América Latina e Washington continua crescendo

por Mark Weisbrot, na Alternet, em 11 de junho de 2008

O establishment da política externa - e a maior parte da mídia dos Estados Unidos - foi pego de surpresa esta semana quando o presidente da Venezuela, Hugo Chávez, afirmou que as Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (FARC) deveriam depor as armas e libertar sem condições todos os reféns. As FARC são um grupo guerrilheiro que luta para derrubar o governo da Colômbia há mais de quatro décadas.

O anúncio de Chávez não deveria ter sido surpreendente, já que ele havia dito a mesma coisa há alguns meses.

No dia 13 de janeiro, por exemplo, Chávez disse: "Eu não concordo com a luta armada e esta é uma das coisas que eu gostaria de discutir com o Marulanda (o líder das FARC que morreu em março)". Chávez também falou de sua oposição a sequestros e fez vários apelos públicos às FARC pela libertação dos reféns.

Chávez já havia dito anteriormente que a luta armada tinha se tornado desnecessária, já que movimentos de esquerda poderiam chegar ao poder através de eleições, o que era geralmente difícil ou impossível no passado por causa da repressão política.

A surpresa nos meios políticos e da mídia dos Estados Unidos é resultado de um engano sobre o papel de Chávez no conflito da Colômbia. Uma comparação: o ex-presidente Jimmy Carter pediu recentemente que os Estados Unidos negociem com o Hamas - um grupo taxado de organização terrorista pelos Estados Unidos e aliados em Israel e Europa. Carter não é defensor do Hamas ou da luta armada. Ele se encontrou com líderes do Hamas e pediu negociações, já que está tentando promover um acordo de paz.

O mesmo é verdade para Hugo Chávez no conflito colombiano. É assim que o papel dele é visto por parentes dos reféns das FARC (inclusive dos empreiteiros militares americanos), ativistas colombianos anti-violência, os governos do Brasil, Argentina, Equador, Bolívia e quase todos os outros estados na região e também na Europa. Nenhuma destas pessoas (inclusive as vítimas das FARC) ou governos admiram as FARC. Eles apóiam solidamente as tentativas de Chávez, inclusive mas não apenas o sucesso obtido este ano com a libertação de seis reféns que eram mantidos pelas FARC.

Mas para Washington e seus aliados de direita na Colômbia, Chávez e as FARC são camaradas em armas. A mídia se concentra em duas ou três declarações positivas de Chávez sobre as FARC (de milhares de horas de discursos) para descrever Chávez como "um sólido apoiador das FARC" (revista Time, 9 de junho). Ontem a Associated Press noticiou, falsamente, que Chávez há cinco meses "pedia a líderes do mundo que dessem apoio à luta armada das FARC".

O Departamento de Estado dos Estados Unidos disse que consideraria colocar a Venezuela na lista de países "patrocinadores do terrorismo". Isso é improvável em um ano eleitoral, já que a Venezuela é nosso quinto maior fornecedor de petróleo e os republicanos já sofrem de dores de cabeça políticas por causa da gasolina a 4 dólares o galão.

Por pelo menos seis anos o governo Bush tem tentado descrever Chávez e seu governo como fornecedor de armas, financiamento e apoio para as FARC.

Até março deste ano, Washington não forneceu evidências, documentadas ou não, de tal apoio. O noticiário com essas acusações era baseado em fontes anônimas. Mas em primeiro de março os militares da Colômbia bombardearam e invadiram um acampamento das FARC no Equador, matando mais de duas dúzias de pessoas. Entre elas o comandante Raul Reyes, que era o negociador-chefe para a soltura dos reféns de mais alto escalão mantidos pelas FARC, e alguns não combatentes. A incursão foi condenada por governos de todo o hemisfério, com exceção dos Estados Unidos e Colômbia.

Os militares colombianos afirmam que capturaram oito provas de informática, inclusive laptops e memórias, durante o ataque. Desde março, o governo da Colômbia divulga arquivos alegadamente obtidos do equipamento, afirmando que os arquivos e mensagens indicam que o governo da Venezuela apoiava as FARC. O governo da Colômbia também alega, baseado nestes arquivos, que as FARC ajudaram a financiar a campanha eleitoral de 2006 do presidente do Equador, Rafael Correa. Tanto a Venezuela quanto o Equador descartam as acusações, com o presidente Correa declarando que os computadores nem mesmo foram apreendidos no acampamento das FARC.

No dia 15 de maio, a organização internacional de polícia INTERPOL divulgou um relatório descrito como tendo "autenticado" os arquivos de computador. Mas o relatório é ambíguo. Em uma parte, diz que a "INTERPOL não encontrou provas de que os arquivos foram criados, modificados ou apagados em qualquer dos oito equipamentos capturados das FARC depois que isso aconteceu, no dia primeiro de março de 2008, por parte das autoridades colombianas."

Isso não significa que não houve alteração ou acréscimo de arquivos, só que a INTERPOL não encontrou "provas de que foram". Mas de acordo com especialistas em segurança não é difícil alterar ou acrescentar arquivos sem deixar rastros. Os especialistas com os quais conversei queriam saber: como a INTERPOL concluiu que poderia garantir que não houve alteração de arquivos? A INTERPOL não responde a esta pergunta crucial em seu relatório de 102 páginas.

Aqui em Washington a tendência é de aceitar como verdade a palavra dos militares da Colômbia. No entanto, os militares da Colômbia, de acordo com o Washington Post, são os mesmos que matam adolescentes na zona rural e os vestem de guerrilheiros. Sem mencionar que 30 deputados aliados ao presidente Uribe já foram presos e 32 outros estão sob investigação por vários crimes, inclusive por envolvimento com esquadrões da morte paramilitares.

A INTERPOL deveria ser uma fonte mais confiável, dado que recebeu uma tarefa limitada. Mas as declarações de seu chefe, Ronald K. Noble - um ex-funcionário do Tesouro americano - levantaram questões sobre a imparcialidade da investigação. No dia 15 de maio Noble disse à imprensa que "nós temos certeza absoluta de que os computadores que nossos especialistas examinaram vieram de um acampamento terrorista das FARC... Ninguém pode questionar se o governo da Colômbia alterou os computadores das FARC."

A primeira sentença é especialmente imprópria, já que a INTERPOL não investigou - nem seu relatório traz qualquer informação a respeito - a origem das provas. A segunda sentença parece exagerada, já que o próprio relatório da INTERPOL admite que as autoridades colombianas não seguiram os procedimentos estabelecidos para lidar com provas eletrônicas nos primeiros dias depois da apreensão.

Naturalmente, mesmo que os arquivos divulgados seletivamente pelo governo da Colômbia forem autênticos - e realmente não temos idéia de quantos deles podem ser - eles apenas dão a versão das FARC para os fatos. Como José Miguel Insulza, chefe da Organização dos Estados Americanos, disse ao Congresso dos Estados Unidos em 10 de abril: "Não há provas - e nenhum país-membro, inclusive este (Estados Unidos) - ofereceu provas à OEA" de que a Venezuela "apóia grupos terroristas."

Os arquivos em si não mostram que a Venezuela deu apoio material às FARC, embora alguns deles descrevam reuniões e promessas de várias autoridades venezuelanas.

Em primeiro de junho o presidente Correa pediu à OEA que investigue as alegações da Colômbia sobre o Equador e a OEA concordou. Tudo indica que a OEA, que Washington já não controla, inocentará o Equador. A Colômbia não tem nada sobre o Equador ou a Venezuela que se sustente em um tribunal ou num procedimento legal.

A controvérsia é uma ilustração do vasto golfo que existe entre a maior parte da América Latina, que agora tem governos de centro-esquerda, e o establishment de política externa dos Estados Unidos. Para a América Latina, Chávez é um amigo e aliado importante na promoção da integração e crescimento econômico regional - inclusive ajudando a criar instituições com esse objetivo, como o Banco do Sul e a UNASUR. Ele espalhou a riqueza do petróleo com alguns vizinhos, ajudando inclusive o cumprimento de promessas eleitorais, o que contribuiu com a democratização da região. Ele promoveu o acordo de paz no conflito da Colômbia. Ele foi eleito repetidamente de forma democrática e para a região seu governo é tão legítimo quanto qualquer outro do mundo. Para os líderes da América Latina essas considerações pesam muito mais do que a retórica e o estilo de confronto com os Estados Unidos - que, afinal, apoiou um golpe militar para derrubar o governo eleito democraticamente em 2002.

Para Washington, Chávez é um perigoso demagogo, um criador de casos "autoritário" que ameaça a democracia (que se confunde com influência dos Estados Unidos) e estabilidade na região. Ele precisa ser isolado e seu governo deslegitimizado, talvez ligando-o ao "terrorismo" ou apresentando Chávez como "ditador". Mas é Washington que enfrenta um crescente isolamento no hemisfério.

Mark Weisbrot is Co-Director of the Center for Economic and Policy Research, in Washington, D.C. (www.cepr.net).

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Publicado em 03/03/2008.

Farcs, relações diplomáticas na América Latina, interferência dos Estados Unidos na política dos países latinos americanos, o que temos a ver com isso?
Qual o papel do Brasil, governo e diplomacia brasileira em um contexto de um conflito anunciado? Que história tem a nossa diplomacia na América Latina? E nós que também fazemos fronteira com a Colômbia que posição o governo brasileiro deve tomar diante desse episódio grave? Nos últimos dias tantos acontecimentos com fortes raízes históricas tem nos feito dedicar nosso olhar para a cobertura da imprensa sobre fatos como a independência unilateral do Kosovo, a renúncia de Fidel e agora a invasão do exército colombiano das fronteiras equatorianas.

Selecionamos a seguir duas abordagens bem diferentes da cobertura da imprensa para o mesmo episódio; uma entrevista do historiador Gilberto Maringoni, a cobertura televisiva da Cuatro, uma matéria de quase uma década da IstoÉ e um pequeno artigo do escritor Antônio Carlos de Mello com o objetivo de oferecer aos professores pontos de vista diferentes para tratamento da questão em sala de aula.

Reportagem da Cuatro:


Ouça a análise do historiador Gilberto Maringoni

Colômbia diz ter provas da ligação do Equador com as Farc

da Folha Online (03/03/2008 - 11h17)

A crise desencadeada pela morte de Raúl Reyes, um dos principais líderes da guerrilha colombiana Farc (Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia), no último sábado (1º), em ataque colombiano em território do Equador, pode gerar um conflito armado na América do Sul.

O governo da Colômbia pediu explicações sobre a possível ligação entre o Equador e a guerrilha colombiana Farc, depois que documentos encontrados pela inteligência colombiana apontaram para a suposta relação Equador-Farc. O governo do Equador, por meio de seu vice-ministro da Defesa, Miguel Carvajal, desmentiu a informação, qualificando-a como "fabulosa" e questionando de onde esses dados teriam saído.

A exigência da Colômbia ocorre após o presidente do Equador, Rafael Correa --aliado declarado do presidente da Venezuela, Hugo Chávez--, decretar a ruptura das relações com Bogotá, expulsar o embaixador colombiano de Quito e de reforçar a presença militar na fronteira entre os dois países.

Membros do governo de Álvaro Uribe, presidente da Colômbia, alegam possuir ao menos dois documentos com informações "reveladoras" que demonstrariam a existência de vínculos entre Equador e as Farc. Tais documentos teriam sido encontrados em três computadores capturados durante o ataque que causou a morte de Reyes, segundo informações do diretor da polícia da Colômbia, Óscar Naranjo.


João Wainer/Folha Imagem


Raúl Reyes, um dos principais líderes das Farc,

morto no sábado pela Colômbia

Os documentos [em pdf] encontrados --disponíveis no site do jornal colombiano "El Tiempo" [em pdf]-- mostram que Reyes teria se reunido com Gustavo Larrea, ministro da Segurança do Equador, para expor seu interesse de oficializar a relação das Farc com o Equador.

De acordo com informações de Naranjo, os documentos mostram ainda que o emissário do governo equatoriano ofereceu levar as Farc a Quito (capital do Equador) porque o presidente Correa desejava discutir a troca de reféns por guerrilheiros das Farc presos na Colômbia, além combinar ações coordenadas comuns na fronteira. O material, com data de 18 de janeiro, também indicaria a reprovação do Equador ao governo de Uribe, chamando-o de "perigoso para a região" e "representante da Casa Branca".

Além da troca de declarações que acirrou o clima de tensão entre os dois países desde o último sábado, Equador foi ainda mais duro e retirou seu embaixador Francisco Suéscum, de Bogotá, e expulsou de Quito o diplomata colombiano Carlos Holguín.

Ao chegar a Quito, o embaixador equatoriano disse que o ataque da Colômbia contra as Farc [que matou Reyes e mais 16 membros da guerrilha], levado a cabo em território equatoriano --região fica na fronteira com a Colômbia--, foi uma "ação de guerra". Durante conversa com jornalistas, Suéscum chamou a operação da Colômbia de "massacre bárbaro, ação contra a paz, contra a vida e contra os direitos humanos".

Após reforçar a fronteira do Equador com o envio de mais tropas, o presidente Correa quer apresentar uma reclamação contra a Colômbia na Corte Internacional de Justiça de Haia (na Holanda) devido ao uso do herbicida glifosato, maléfico à população e à natureza, nas fumigações aéreas de combate às drogas na divisa entre os dois países.

Segundo o Equador, o glifosato não só destruiu plantações de coca e papoula no lado colombiano, mas, levado pelo vento, causou danos irreparáveis a povoações e ao meio ambiente do lado equatoriano.

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REGIÃO INVADIDA PELA COLÔMBIA É CLARAMENTE DEMARCADA PELO RIO PUTUMAYO

Luiz Carlos Azenha: Atualizado em 03 de março de 2008 às 14:11 | Publicado em 03 de março de 2008 às 13:48

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SÃO PAULO - A região em que militares colombianos, com tecnologia e armamentos dos Estados Unidos, eliminaram o número 2 das Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (FARC), é claramente demarcada pelo rio Putumayo (no mapa acima, à direita da cidade de Puerto Assis, na Colômbia).

Isso é suficiente para colocar por terra a primeira versão apresentada pelo governo de Álvaro Uribe, de que teria agido "em legítima defesa" depois de perseguir uma coluna de guerrilheiros na região.

O presidente do Equador, Rafael Correa, disse que foi informado da operação, por telefone, pelo colega colombiano, segundo o qual a invasão do território equatoriano teria se dado a partir de um confronto.

Porém, quando os militares equatorianos chegaram ao local do acampamento descobriram que ele havia sido bombardeado. Duas sobreviventes do ataque foram levadas para um hospital de Quito.

O Equador alega que tropas colombianas desembarcaram cerca de dois quilômetros ao sul do rio Putumayo. Fizeram isso com certeza porque um soldado colombiano foi morto no confronto e a ação colombiana envolveu o resgate do corpo de Raúl Reyes, que foi levado para a Colômbia - assim como computadores e documentos da guerrilha.

O material apreendido foi examinado por peritos de agências de segurança dos Estados Unidos, conforme o próprio governo colombiano admitiu em nota oficial. De posse do material, o governo americano poderá divulgá-lo seletivamente, de acordo com seus objetivos políticos.

O governo da França já se adiantou a essa possibilidade e lamentou a morte de Raúl Reyes, confirmando que ele era intermediário entre os franceses e as FARC para a libertação da refém Ingrid Betancourt, que tem cidadania colombiana e francesa.

A versão do presidente do Equador de que os guerrilheiros foram mortos enquanto dormiam foi reforçada pelas próprias roupas vestidas por Raúl Reyes. Essa foto foi divulgada pelo jornal colombiano El Tiempo:

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A operação também demonstra o altíssimo grau de envolvimento dos Estados Unidos com as forças militares da Colômbia. Os ataques, que envolveram aviões e helicópteros - segundo o governo do Equador - aconteceram durante a noite.

Ou seja, uma operação noturna desse gênero, em região de selva, exige um grau de perícia, preparo e equipamento só disponível em forças armadas altamente sofisticadas, que trabalham com equipamento que permite ver na escuridão, similar ao que aparece abaixo.

Eu mesmo estive em uma base militar dos Estados Unidos acompanhando treinamento do exército para ações noturnas, antes da invasão do Iraque. As operações envolviam helicópteros e o ataque de comandos a uma cidade-cenário em plena escuridão.

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Não se pode descartar o fato de que os Estados Unidos controlam a base Eloy Alfaro, em Manta, na costa do Equador, a partir da qual alegam "monitorar o narcotráfico" na região. O presidente Rafael Correa já afirmou que não pretende renovar a concessão para o uso da base, quando ela vencer, em 2009.

É preciso considerar que a região de selva amazônica nas fronteiras entre Colômbia, Equador, Peru, Venezuela e Brasil são de uma imensidão incalculável. Estive na serra do Divisor, no Acre, na fronteira do Brasil com o Peru, onde os brasileiros ouviam rádios peruanas e eram testemunhas da passagem de narcotraficantes e de guerrilheiros do grupo peruano Sendero Luminoso. Subimos o rio Moa acompanhados por uma patrulha do Exército brasileiro. A certa altura, a escolta disse que não poderia mais nos acompanhar.

Temiam provocar algum conflito que resultasse em tiroteio com guerrilheiros e traficantes - como nossa equipe de reportagem no meio. O comandante da operação disse que, a partir daquele ponto do rio, só estavam autorizados a subir grupos de mais de 50 soldados brasileiros - nossa escolta tinha cerca de dez.

É nesse contexto que é preciso entender operação colombiana em território do Equador. O governo Uribe entendeu que tinha mais a ganhar do que a perder com a ação. E dificilmente faria isso sem autorização superior, ou seja, dos Estados Unidos.

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Do blog do Mello

Sexta-feira, 25 de Janeiro de 2008

Por que as FARC não abandonam a luta armada, fundam um partido e disputam eleições democráticas?

Guerrilheira das FARC

Porque elas já tentaram isso. Em 1984 firmaram uma trégua com o então presidente da Colômbia Belisario Betancourt. As FARC abandonaram as armas e se transformaram num partido político, União Patriótica (UP).

Resultado: o governo da Colômbia se aproveitou do fato e matou três mil militantes, oito congressistas, dois candidatos presidenciais, 11 prefeitos e 13 deputados regionais.

Você, meu arguto leitor, minha sagaz leitora, havia lido essas informações na nossa “grande imprensa democrática”?


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Cerca de dez anos antes, a Colômbia e as Farcs ganhavam as manchetes da imprensa mas com foco muito diferente:







Encontros históricos: na época em que o governo colombiano apostava no diálogo.
Nas fotos Pastrana à esquerda abraça o líder das Farc Tirofijo e à esquerda Reys que foi executado nesta semana. As fotos são do final da década de 1990


Extraído de IstoÉ Nº 1528 – 13 de janeiro de 1999

C O L Ô M B I A
Paz revolucionária
Governo tenta costurar acordo com as Farc, apesar da ausência do líder rebelde "Tirofijo"



Encontro: Presidente Andrés Pastrana (ao centro) negocia a paz em território das Farc, sob o olhar de guerrilheiros como a jovem Diana (à dir.)

CLÁUDIO CAMARGO E ALAN RODRIGUES (FOTOS), DE SAN VICENTE DEL CAGUÁN

Eles foram chegando lentamente, nas primeiras horas da noite de quarta-feira 6. Armados até os dentes e vestidos com fardas camufladas novinhas em folha, os guerrilheiros das Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc) ocuparam a praça central e as principais ruas de San Vicente del Caguán, uma pequena cidade no Sudoeste da Colômbia a 700 quilômetros de Bogotá, a capital. Os guerrilheiros, que virtualmente já controlam o povoado, foram encarregados da segurança da histórica solenidade de abertura das conversações de paz entre o governo colombiano e as Farc, que se instalariam no dia seguinte, para tentar pôr fim a mais de 40 anos de conflito armado com o grupo insurgente mais antigo da América Latina. "Hoje é o dia mais feliz da minha vida. Sinto que meu coração está grande", emocionava-se uma velhinha nas primeiras horas da ensolarada manhã da quinta-feira 7. Mas o início das negociações acabou sendo palco de uma grande frustração, que fez pairar nuvens sombrias sobre o futuro do processo de paz. Na última hora, o comandante máximo das Farc, Manuel Marulanda Velez, o "Tirofijo" (tiro certeiro), não compareceu à cerimônia, como estava previsto, para abrir os trabalhos ao lado do presidente da Colômbia, Andrés Pastrana Arengo. Ele foi representado por três altos comandantes das Farc.

A imprevista ausência do líder máximo foi atribuída pela guerrilha à descoberta de um plano para assassiná-lo. "A ausência de Marulanda não pode ser razão para não seguirmos adiante na instalação das negociações de paz", disse o presidente Pastrana, que logo depois de ter sido eleito, em agosto passado, tomou a iniciativa de encontrar-se com Tirofijo em território da guerrilha. Apesar da alegação de um plano para assassinar Marulanda, tudo indica que a mais antiga força guerrilheira do continente sucumbiu a uma estratégia de marketing. Afinal, Tirofijo é um mito vivo e sobre o qual circulam as mais fantásticas histórias. Mas ele já está velho, com quase 70 anos. Não se sabe em que condições físicas ele se encontra atualmente e qual o impacto que causaria no público eventuais tropeços de um veterano líder que está internado na selva colombiana há mais de três décadas e desconhece as armadilhas de uma superexposição na mídia.

Ainda é muito cedo para saber se essa terceira tentativa de acabar com o conflito terá melhor sorte que as anteriores. Mas o fato é que, desta vez, o presidente Pastrana demonstrou uma vontade política muito maior do que seus antecessores. Pela primeira vez na história colombiana, o governo aceita vir ao território da guerrilha para negociar, num reconhecimento explícito do poderio militar e político das Farc, que contam com quase 15 mil homens muito bem equipados, controlam quase 40% do território da Colômbia e chegam a obter US$ 1 bilhão por ano com atividades ilegais. San Vicente del Caguán, por exemplo, é o centro do que ficou conhecido como "Farcolândia", santuário do grupo guerrilheiro no Departamento de Caquetá. Há poucos meses, o governo atendeu à reivindicação dos rebeldes e retirou cerca de 900 soldados do Exército agrupados no Batalhão de Caçadores. Acusado pelos rebeldes de usar táticas genocidas na luta contra-insurgente, o Exército foi o grande ausente na cerimônia de abertura das negociações, que teve até troca de gentilezas entre comandantes guerrilheiros e oficiais da Polícia Nacional que vieram fazer a proteção presidencial.

Em San Vicente del Caguán, os guerrilheiros sempre circularam com desenvoltura entre os habitantes. Mas certamente eles nunca haviam entrado na cidade de maneira tão estrepitosa como nestes dias. Chegaram transportados em novíssimas caminhonetes Land Cruiser da Toyota. Carregavam fuzis M-16 (americanos), AK-47 (russos), FAL (belgas), morteiros e poderosas metralhadoras calibre ponto 50. Seus uniformes camuflados são muito semelhantes aos do Exército colombiano. Os rebeldes só se distinguem dos militares pela ausência de insígnias e pelas botas de borracha (o Exército usa os tradicionais coturnos).

Chama a atenção a grande participação feminina na força guerrilheira. E as mulheres estavam produzidas para o evento. Em meio à farda e ao arsenal de meter medo, grande parte exibia unhas pintadas, usava batom, brincos, anéis e pulseiras em meio à farda e ao armamento. A guerrilheira Diana, 20 anos, chamava a atenção pela beleza. "Estou na guerrilha há 11 meses", contou ela a ISTOÉ. "Eu era estudante, mas não via perspectiva nenhuma em meu país sem uma mudança profunda. Por isso, entrei nas Farc." O rosto angelical esconde talvez uma atiradora exímia, que, apesar da pouca idade e experiência, diz ter participado de combates. "Você não tem medo de morrer?", pergunta o repórter. "É claro que eu tenho. Mas isso não é motivo para eu abandonar a luta", diz, convicta, mas com olhar ligeiramente malicioso. Nem todos os guerrilheiros têm a doçura de Diana. "Nós lutamos por uma mudança profunda nas estruturas. Queremos uma pátria socialista", diz, sem meio-termo, um guerrilheiro, este sim mais afinado com o figurino tradicional.

Nos próximos dez dias, quando a agenda das negociações começar a ser definida, se saberá se essa iniciativa terá mais êxito do que as demais. O processo agora vai enfrentar uma dura prova. O governo do presidente Andrés Pastrana já admitiu concessão de autonomia para os territórios controlados pelas Farc. Mas há muitas questões delicadas, como o problema dos paramilitares, forças criadas pelo Exército nos anos 80 para realizar o trabalho sujo contra a guerrilha. Das cerca de 70 mil mortes pela violência, os paramilitares respondem por dois terços. E agora eles se transformaram numa força autônoma muito poderosa, com apoio de fazendeiros e narcotraficantes. Eliminá-los é um ponto de honra para os guerrilheiros. Resta saber se o governo terá força suficiente para isso. "É um processo que vai demorar muito. É como uma porcelana. Temos que cuidar dela, olhá-la, contemplá-la e não deixar que ela se quebre", disse o senador Fabio Valencia Cossio, presidente do Congresso e membro da Comissão de Negociação. "Não podemos mais continuar a ser três países irreconciliáveis: um país que mata, outro que morre e um terceiro que abaixa a cabeça horrorizado e fecha os olhos", afirmou o presidente Pastrana no final de seu discurso.


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