Robert Fisk, 24/1/2009, The Independent, UK
Cartas que não aparecem na coluna "Carta do Leitor". Primeiro, Jack Hyde, leitor, escreve sobre uma possível (verdadeira) razão por trás da carnificina em Gaza. Inclui um artigo, de Michel Chossudovsky, economista da Universidade de Ottawa, que diz que "a intervenção militar na Faixa de Gaza, pelo exército de Israel, tem relação direta com o controle e a propriedade sobre reservas estratégicas de gás em águas territoriais". Não é exatamente "A conspiração". Mas é assunto que Obama e seus rapazes e moçoilas podem ter de estudar nos próximos dias.
Segundo Chossudovsky, a empresa British Gas e os sócios Contractors International Company, empresa que tem base em Atenas e que, segundo o artigo, seria propriedade de duas famílias libanesas, teriam recebido, da Autoridade Palestina de Arafat, em 1999, exclusividade para explorar por 25 anos o petróleo do litoral de Gaza. Cerca de 60% das reservas submarinas, no litoral Gaza - Israel, pertence à "Palestina" (que ninguém sabe dizer onde fica atualmente).
Mas depois da vitória eleitoral do Hamás em 2006 e de ter tomado o poder em 2007, o governo do Hamás teria sido descartado – e o pobre velho "presidente" Máhmude Abbas, ilhado na Cisjordânia, só consegue espiar de longe o Mediterrâneo do alto de uma colina perto de Jenin. Muitas negociações depois – e depois de os oficiais da "defesa" de Israel terem declarado que os palestinenses só poderiam ser pagos em bens móveis, pelo seu gás, não em dinheiro que acabaria nas mãos do temido Hamás –, foi proposto um acordo pelo qual o gás palestino de Gaza seria conduzido por gasoduto submarino até o porto israelense de Ashkelon; assim, o controle sobre a venda do gás seria transferido para Israel. A British Gas afastou-se dessas negociações em dezembro de 2007.
Mas em junho de 2008 – quando, segundo o jornal israelense Haaretz, Israel começou a planejar a invasão de Gaza – Israel repentinamente convidou a British Gas para voltar às negociações. E, diz Chossudovsky, recomeçaram as negociações para comprar o gás natural de poços existentes no litoral de Gaza.
Os tanques israelenses já saíram da Faixa de Gaza, mas a marinha de guerra israelense ainda controla a costa e por razão óbvia: se os israelenses podem continuar a violar a lei internacional e ocupam terra palestina na Cisjordânia, por que não assaltariam também a soberania da Palestina sobre os campos submarinos de gás de Gaza? Se Israel pode anexar Jerusalém, por que não anexar também as áreas de mar?
Minha caixa postal recebe também material muito menos interessante. Amigos libaneses mostraram-me cópias de um novo blog palestino, no qual fotos de mulheres palestinas em fila nos abomináveis pontos de controle da fronteira israelense e de soldados israelenses que atiram em Palestinos são "comparadas" com fotos de arquivo do Holocausto de judeus. Mas as mulheres e crianças em fila nas fotos mais antigas estão entrando em Auschwitz, e a imagem em branco e preto de um soldado nazista atirando com rifle foi artisticamente manipulada para apagar duas figuras à direita na foto original: uma mulher judia com o filho no colo, que recebe tiros pelas costas.
Sim, não tenho dúvidas de que os israelenses cometeram crimes de guerra em Gaza. E no Líbano. Mas a comparação que o blog palestino faz autoderrota-se, porque é baseada numa mentira.
E o que fazer, por exemplo, com outro panfleto que encontro na minha caixa postal, dos "refugiados de Ein Karem, Jerusalém"? Esses palestinos, expulsos originalmente da Palestina de 1948 no primeiro ataque de limpeza étnica perpetrado por Israel, dizem que "considerados os atuais eventos em Gaza e na Palestina", Israel deve ser "desmontado" [orig. "dismantled"], porque "os atos selvagens do exército de Israel [estão] muito além dos crimes de guerra cometidos na II Guerra Mundial". Francamente! Na II Guerra Mundial foram massacrados 60 milhões de seres humanos; o número de judeus mortos é equivalente à atual população da Palestina, incluídos os refugiados.
Mas não pensem que esse seja o único nonsense que paira no ar. Uma carta sem nome de autor nem endereço chega para contar-me que estou estimulando "o fundamentalismo extremista a atacar Países Ocidentais", de tanto que eu insisto na "história da carochinha" [orig. "the old chestnut"] da "proporcionalidade".
Sem considerar o fato de que os muçulmanos estão furiosos por causa da selvageria de Israel em Gaza – não por eu reportar a selvageria – o leitor pergunta: "Não morreram muito mais civis alemães na última guerra, que civis britânicos? Todos os generais britânicos deveriam acusados de criminosos de guerra? Não venha com nonsense!"
Aquela velha história, é claro. Agora então, parece, OK se se matam 100 palestinos em Gaza para cada israelense na área... Porque "nós, os ingleses" matamos mais civis alemães do que os alemães mataram civis ingleses na IIª Guerra Mundial. A observar, aqui, o modo como, sutilmente, os alemães são transformados em palestinos chacinados, e os israelenses (e seus cruéis generais) são transglorificados, como, suponho, o Marechal Harris da Força Aérea inglesa.
E há uma carta ainda mais interessante, não assinada, que chegou ao meu escritório em Beirute essa semana – enviada de um endereço em Wimbledon – que merece ser reproduzida na íntegra:
"Prezado Sr. Fisk, assisti recentemente a uma entrevista que o senhor deu ao canal French News TV. Fiquei impressionado (a?) com o tamanho e o comprimento de seu nariz de batata do senhor (sic). É verdade que os bandidos neonazistas do Hamás alugaram o seu nariz, como escudo pra se defenderem dos israelenses? Atenciosamente..."
Outra vez, os palestinos foram convertidos em nazistas alemães. Respondo a essa imundície racista? Sim, melhor, sim, com a ameaça de processá-lo, como sempre. Mas juro, juro – juramento que esse seu repórter sempre repete – que jamais mencionarei a IIª Guerra Mundial!
Artigo original pode ser lido aqui
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