Guila Flint
De Tel Aviv para a BBC Brasil
03 de fevereiro, 2009 - 14h13 GMT (12h13 Brasília)
A falta de oposição significativa em Israel à sua recente operação militar na Faixa de Gaza indica um processo de endurecimento da sociedade israelense, na opinião de analistas ouvidos pela BBC Brasil.
Tal processo pode, de acordo com os especialistas, se refletir nas eleições gerais, marcadas para o dia 10 de fevereiro. Os beneficiados, nesse caso, seriam partidos mais conservadores, que defendem maior rigidez nas relações com os palestinos.
"Essa guerra marcou uma mudança dramática na sociedade israelense", avalia o historiador Arie Arnon, da Universidade Ben Gurion. "Dessa vez, quase não houve oposição."
Nos primeiros dias da ofensiva à Faixa de Gaza, chamada pelas autoridades israelenses de "Operação Chumbo Fundido", as pesquisas de opinião indicavam um apoio de cerca de 80% da população ao bombardeio intenso do territorio palestino.
"Exceto por alguns milhares de humanistas e pacifistas, que foram contra os ataques desde o inicio, a população apoiou o governo, e os canais de televisão colaboraram quase que totalmente com o Exército, filtrando as imagens da terrivel destruição causada em Gaza", afirma Arnon.
"Os canais de TV locais mostraram muito pouco das imagens que o mundo todo viu."
Segundo uma pesquisa encomendada pelo canal 2 da TV israelense, 84% do publico apoiou a cobertura da mídia israelense do que ocorreu na Faixa de Gaza. Apenas 15% reclamaram de falta de informações.
Justificativa
O governo israelense justificou a ofensiva dizendo que não tinha outra alternativa para lidar com o grupo Hamas, que tomou o controle da Faixa de Gaza em 2007 e vinha lançando mísseis de fabricação caseira contra o território israelense.
"Depois de oito anos de ataques constantes com foguetes contra civis israelenses, Israel não tinha outra alternativa exceto implementar seu direito legitimo de auto defesa", afirmou o governo na época.
Tal justificativa convenceu muitos dos que, em conflitos anteriores, costumavam criticar as operações militares de Israel contra grupos palestinos.
O escritor A. B. Yehoshua, considerado um dos mais importantes intelectuais da esquerda israelense, foi um deles. Em artigo publicado no jornal Haaretz, o escritor apoiou a ofensiva contra Gaza.
"O que estamos tentando fazer é levar os lideres (palestinos) a parar a agressão (contra civis israelenses)", escreveu Yehoshua. "Infelizmente, crianças também estão morrendo apenas por causa da mistura trágica e deliberada entre combatentes do Hamas e a população civil."
Cerca de 34 mil pessoas assinaram um abaixo-assinado contra a âncora do canal 2, Yonit Levi, por ela ter demonstrado empatia com o sofrimento dos "inimigos".
Durante as três semanas da ofensiva, pelo menos 1,3 mil palestinos morreram - quase um terço delas crianças - e 5,5 mil ficaram feridos durante o conflito, de acordo com médicos em Gaza. Treze israelenses morreram - três deles civis.
Poucos protestos
Apesar das poucas críticas, há quem acredite que o forte apoio ao governo seja um problema.
"A reação do publico à ofensiva em Gaza demonstrou uma grave deterioração moral da sociedade israelense", disse o professor de Sociologia Politica e diretor do Instituto Humphrey de Pesquisas Sociais, Lev Grinberg, à BBC Brasil.
"Em 1982, quando falangistas libaneses cometeram o massacre de Sabra e Chatila, com a ajuda indireta do Exército israelense, 400 mil manifestantes sairam às ruas para protestar", afirmou, para depois lembrar que "apenas alguns milhares" protestaram contra a ação em Gaza, em atos pouco registrados pela imprensa.
O sociólogo diz acreditar que, ao longo desta década, a esperança em uma solução pacífica para o conflito na região tenha diminuído em Israel.
"Desde o inicio da (segunda) Intifada, em 2000, a sociedade israelense abandonou a esperança em uma solução politica para o conflito com os palestinos e passou a apoiar mais e mais o uso da força, a linguagem do ódio está prevalecendo e isso explica o crescimento de (Avigdor) Liberman nas pesquisas de opinião", afirma Grinberg.
Liberman, líder do partido de extrema direita Israel Beiteinu ("Israel é nosso lar"), defende o cancelamento da cidadania de árabes que não demonstrarem "fidelidade" ao Estado.
Ele também é a favor da expulsão dos deputados árabes, os quais considera "infiéis", do Parlamento e sugere uma "troca de populações e territórios", em que as aldeias árabes de Israel seriam transferidas para um futuro Estado Palestino e os assentamentos israelenses na Cisjordania seriam anexados a Israel.
Pesquisas recentes de opinião indicam que, nas proximas eleições, o partido de Liberman poderá obter um aumento de quase 50% no número de cadeiras que ocupa no Parlamento, das 11 atuais para 16, o que faria dele o terceiro maior partido de Israel, depois do conservador Likud, líder nas pesquisas, e do partido governista Kadima, de centro.
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