Por Rodrigo Vianna, do blog O Escrevinhador
segunda-feira, 02 de março de 2009 às 09:45
O Marcelo Coelho (colunista da "Folha") decidiu escrever sobre a "ditabranda".
O texto está no blog dele Marcelo Coelho/Folha.
Marcelo reconhece que o termo usado em editorial pelo jornal, para se referir ao regime millitar brasileiro (1964-1985) é "infeliz". Ufa, que alívio!
Mas, depois, ele se rende a um lamentável contorcionismo verbal, para tentar justificar a posição do jornal.
Hum...
"Marcelo quer agradar o patrão?"
Os leitores não são bobos. Por isso, Marcelo apanha feio nos comentários do blog. Um dos leitores chega a dizer: "não faça isso com o seu nome, com sua memória. Um emprego na Folha não vale sua alma".
Hum... Será que não vale?
Marcelo não é só colunista. É membro do Conselho Editorial da "Folha". Há muito o que defender, portanto.
"Gaspari: Folha dava carona pro DOI-CODI"
Dois argumentos usados por ele me deixaram levemente irritado (não muito, porque já não esperava grande coisa de quem cumpre o papel de escrever pra livrar a cara do patrão).
1) Marcelo diz que a carta de Fabio Konder Comparato trazia uma intenção oculta: "Tratava-se de defender Chávez, mais do que acreditar na tese de que a “Folha” teria passado a apoiar a ditadura. A resposta de Otavio a Comparato quis denunciar essa hipocrisia, essa indignação postiça, chamando-a de cínica."
Fui reler a carta de Comparato, para ver como o brilhante professor tinha feito a defesa de Chavez. Não encontrei, no texto de Comparato, nenhuma referência ao presidente da Venezuela.
Queria que o Marcelo nos mostrasse onde está a defesa de Chavez. Por favor, Marcelo, onde está?
Falo de fatos, não de opinião. Não há defesa de Chavez na carta de Comparato. A não ser que Marcelo tenha advinhado as intenções malévolas do professor!
E, outra coisa: ainda que Comparato defendesse Chavez (o que não ocorreu), isso não muda o fato de a "Folha" ter usado um termo errado, absurdo, para se referir a um regime que torturava, matava, e coordenava a "Operação Condor" em toda a América do Sul: a ditadura brasileira.
2) Marcelo também embarca na mitologia de uma "Folha" democrática.
"Há pelo menos 30 anos, a “Folha” reprova o autoritarismo. Teve, se não me falha a memória, papel importante na luta contra o regime militar."
Desculpe, Marcelo, mas sua memória falha.
Talvez, você esteja confuso, diante dos compromissos com o nono andar da rua Barão de Limeira.
A "Folha", onde trabalhei por 3 anos no início dos anos 90, teve um papel importante na campanha das Diretas-Já. Isso é fato.
O jornal sentiu que o vento estava soprando pro lado da democracia, e resolveu aderir. Aproveitou o "nicho de mercado", trouxe intelectuais para a página 3, deu voz à sociedade civil. Mas, isso tudo, só depois da Anistia em 79.
Antes disso, Marcelo, a família Frias estava colada com a ditadura. E com a linha-dura dos militares.
Veja o que Mino Carta conta sobre o jornal (a declaração de Mino consta de artigo do jornalista Alípio Freire, que me chega pela internet):
"(...) hoje você vê esses anúncios da Folha - o jornal desse menino idiota chamado Otavinho [Otavio Frias Filho] - esses anúncios contam de um jeito que parece que a Folha, nos anos de chumbo, sofreu muito, mas não sofreu nada. Quando houve uma mínima pressão, o sr. Frias afastou o Cláudio Abramo da direção do jornal. Digo que foi a "mínima pressão" porque o sr. Frias estava envolvido na pior das candidaturas possíveis, na sucessão do general Geisel. A Folha estava envolvida com o pior, apoiava o Frota [general Sílvio Frota, ministro do Exército no governo Geisel]. O Claudio Abramo foi afastado por isso.“
("A mídia implorava pela intervenção militar" Entrevista com Mino Carta. Por Adriana Souza Silva, da Redação AOL, abril de 2004)
Marcelo, como você sabe, por ser amigo íntimo da família, o velho Frias e os filhos tiveram que morar no prédio da "Folha", porque temiam as ações da esquerda armada nos anos 70.
E por que? Porque a "Folha" punha seus carros de entregar jornal a serviço da meganha da OBAN, a serviço dos torturadores. Nos anos 70, esse era o "nicho" onde seu Frias e o sócio Carlos Caldeira colhiam bons negócios.
Não sou eu que estou dizendo, Marcelo.
Em "A Ditadura Escancarada", Élio Gáspari (hoje, colunista da "Folha") solta (sem grande alarde, porque ele não está aqui para causar constrangimentos à família Frias) uma informação interessante:
"Carros da empresa [Folha] eram emprestados ao DOI, que os usava como cobertura para transportar presos na busca de 'pontos' " (p. 395).
Hum...
Não é só o Ivan Seixas quem diz. O Élio Gáspari também sabe. Escreveu e nunca foi desmentido pelo jornal.
E por que? Porque até as horrorosas pastilhas que enfeitam o prédio da "Folha", na rua Barão de Limeira, sabem que isso é verdade.
Mas, a "Folha" segue posando de democrata.
Os Mesquita não são santos. Apoiaram o golpe de 64. Depois, se arrependeram publicamente, e passaram à oposição. Nunca emprestaram carro pra torturador. A história do "Estadão" está aí. Ninguém precisa reescrevê-la.
Já a "Folha" tem um passado a ocultar. Coisa feia.
Todos nós erramos, não é, Marcelo?
Quando isso acontece, o melhor a fazer é reconhecer o erro, pedir desculpas, e tentar repará-lo, quando for possível.
A "Folha" se nega a fazer isso. O Otavinho (que devia ir criar galinhas) prefere insultar professores covardemente.
Mas, você, Marcelo, podia pedir desculpas pelo artigo lamentável no seu blog. Teria todo o meu respeito. Porque erros todos nós cometemos.
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