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segunda-feira, 29 de dezembro de 2008

Apelo da sociedade civil palestina: boicote à política sionista do governo israelense

Resultado da política sionista:

  • 282 mortos e 900 feridos pelos F-16 de Israel
  • 100 toneladas de bombas sobre uma população civil indefesa
  • cumplicidade da União Europeia no crime
  • Apelo da sociedade civil palestina: "Cessar o massacre de Gaza – Boicotar Israel já!"

    por BNC [*]

    Hoje, 27/Dezembro/2008,o exército israelense de ocupação cometeu um novo massacre em Gaza, matando e ferindo centenas de civis palestinos, inclusive um número ainda não estabelecido de escolares que retornavam da escala quando começaram os primeiros ataques israelenses. Este último banho de sangue, se bem que mais implacável que os anteriores, não é o primeiro perpetrado perpetrado pelo Estado sionista. Ele coroa meses de um sítio israelense contra Gaza que deveria ser amplamente condenado e sancionado como um acto de genocídio contra 1,5 milhão de palestinos que vivem naquela faixa costeira.

    Gaza, 27 décembre 2008 (palestine-info.cc)

    Israel parece querer marcar o seu 60º ano de existência da mesma maneira como se instalou – a perpetrar massacres contra o povo palestino. Em 1948, a maioria da população palestina autóctone sofreu uma limpeza étnica sendo expulsa dos seus lares e das suas terras, em parte por massacres como o de Deir Yassin. Hoje, os palestinos de Gaza, cuja maior parte é constituída por refugiados, não tem mesmo a opção de procurar refúgio em outro lado. Aprisionados por trás dos muros de um gueto e acuados à beira da fome pelo sítio, eles são os alvos fáceis dos bombardeamentos cegos de Israel.

    O professor Richard Falk, relator especial do Conselho dos Direitos Humanos das Nações Unidas para os Territórios Palestinos Ocupados e professor emérito de direito internacional na Universidade de Princeton, descreveu nestes termos o cerca israelense de Gaza no ano passado, quando este ainda não era comparável em gravidade à situação actual:

    "Será um exagero irresponsável associar o tratamento dos palestinos às práticas de atrocidades colectivas dos nazis? Não creio. Os recentes desenvolvimentos em Gaza são particularmente inquietantes porque exprimem de modo evidente uma intenção deliberada da parte de Israel e dos seus aliados de submeter toda uma comunidade humana a condições da maior crueldade que põem em perigo a sua vida. A sugestão de que este esquema de conduta é um holocausto em vias de ser feito representa um apelo bastante desesperado aos governos do mundo e à opinião pública internacional para que ajam com urgência a fim de impedir que estas tendências actuais ao genocídio não conduzam a uma tragédia colectiva".

    O episódio mais brutal desta "tragédia colectiva" é o que vemos hoje

    Os crimes de guerra de Israel e outras graves violações do direito internacional em Gaza, assim como no resto dos territórios palestinos ocupados, inclusive Jerusalém, não teriam podido ser cometidos sem a cumplicidade directa ou indirecta dos governos do mundo, em particular dos Estados Unidos, da União Europeia, do Egipto e de outros regimes árabes.

    Enquanto o governo dos Estados Unidos sempre apadrinhou, financiou e protegeu da censura internacional as políticas do apartheid e coloniais de Israel contra a população autóctone da Palestina, a União Europeia mostrou-se incapaz no passado de apresentar uma cara de respeito pelo direito internacional e pelos direitos humanos universais. Esta distinção terminou efectivamente a 9 de Dezembro último, quando o Conselho da União Europeia decidiu por unanimidade recompensar o desprezo criminoso de Israel pelo direito internacional com a revalorização do Acordo de associado entre a UE e Israel. Este deduziu claramente, a partir desta decisão, que a UE tolera as suas acções contra os palestinos submetidos à sua ocupação. A sociedade civil palestina recebeu igualmente a mensagem: os governos europeus tornaram-se tão cúmplices dos crimes de guerra de Israel quanto o governo dos EUA.

    A grande maioria dos governos do mundo, particularmente no Sul, têm igualmente uma parte da responsabilidade. Continuando como de costume a fazer negócios com Israel, por acordos comerciais, compras de armas, ligações universitárias e culturais, aberturas diplomáticas, ele forneceram a base necessária para a cumplicidade das potências mundiais e, em consequência, à impunidade de Israel. Além disso, a sua inacção na ONU é indesculpável.

    O padre Miguel D'Escoto Brockman, presidente da Assembleia Geral da ONU, preconizou num discurso recente diante da Assembleia o único caminho moral a seguir pelas nações do mundo nas suas relações com Israel:

    "Há mais de 20 anos, nós, as Nações Unidas, havíamos seguido a via da sociedade civil quando havíamos acordado que eram necessárias sanções para proporcionar meios de pressão não violentos contra a África do Sul a fim de que ela ponha fim às suas violências. Hoje deveríamos considerar seguir a via de uma nova geração da sociedade civil, que apela a uma campanha não violenta semelhante de boicote, de desinvestimento e de sanções para fazer pressão sobre Israel a fim de que ponha um fim às suas violações".

    Agora, mais do que nunca, o Comité Nacional Palestino para o Boicote, o Desinvestimento e as Sanções (BNC) apela à sociedade civil internacional a que não se limite a protestar e condenar de diversas maneiras o massacre perpetrado por Israel em Gaza, mas a igualmente associar-se à campanha internacional de Boicote, Desinvestimento e Sanções contra Israel para por fim à sua impunidade e fazê-lo responsável por suas violações sistemáticas do direito internacional e dos direitos dos palestinos. Sem uma pressão sustentada e eficaz exercida pelas pessoas de consciência do mundo inteiro, Israel continuará a perpetrar gradualmente seus actos de genocídio contra os palestinos, enterrando toda perspectiva de uma paz justa no sangue e sob as ruínas de Gaza, Nablus e Jerusalém.

    Comité Nacional Palestino para o Boicote, o Desinvestimento e as Sanções (BNC)
    [Palestinian Boycott, Divestment and Sanctions National Committee, (BNC)]
    Ramalá ocupada, Palestina
    27 de Dezembro de 2008.


    [*] O Comité Nacional Palestino para o Boicote, o Desinvestimento e as Sanções (BNC) inclui as seguintesorganizações:
    Council of National and Islamic Forces in Palestine;
    General Union of Palestinian Workers;
    Palestinian General Federation of Trade Unions;
    Palestinian Non-Governmental Organizations' Network (PNGO);
    Federation of Independent Trade Unions;
    Union of Palestinian Charitable Organizations;
    Global Palestine Right of Return Coalition;
    Occupied Palestine and Golan Heights Advocacy Initiative (OPGAI);
    General Union of Palestinian Women;
    Palestinian Farmers Union (PFU);
    Grassroots Palestinian Anti-Apartheid Wall Campaign (STW);
    Palestinian Campaign for the Academic and Cultural Boycott of Israel (PACBI);
    National Committee to Commemorate the Nakba;
    Civic Coalition for the Defense of Palestinian Rights in Jerusalem (CCDPRJ);
    Coalition for Jerusalem ; and Palestinian Economic Monitor.


    Ver também: Uruk net
    Texto original em inglês: BDS Palestine
    Texto em francês: Silvia Catorri
    Versão em português: Resistir info.


    Se Gaza cair...*

    Sara Roy**

    O sítio de Gaza, por Israel, começou dia 5/11/2008, um dia depois de Israel ter atacado a Faixa, ataque feito – sem possibilidade de dúvida – para pôr fim à trégua estabelecida em junho entre Israel e o Hamás. Embora os dois lados tenham violado antes o acordo, nunca antes acontecera qualquer violação em tão grande escala. O Hamás respondeu com foguetes, e desde então a violência não recrudesceu.

    Com o sítio, Israel visa a dois principais objetivos. Um, reforçar a idéia de que os palestinos são problema exclusivamente humanitário, como pedintes, mendigos sem qualquer identidade política e, portanto, sem reivindicações políticas. Segundo, impingir a questão de Gaza, ao Egito.

    Por isso, os israelenses toleram as centenas de túneis que há entre Gaza e o Egito, pelos quais começou a formar-se um setor comercial informal, embora cada vez mais regulado. A muito grande maioria dos habitantes da Faixa de Gaza vive em condições de miséria, com 49,1%, estatísticas oficiais, de desempregados. De fato, os habitantes de Gaza já sabem que está desaparecendo rapidamente, para todos, qualquer possibilidade real de emprego.

    Dia 5/11, o governo de Israel fechou todas as vias de entrada e saída de Gaza. Comida, remédios, combustível, peças de reposição para as redes de energia, água e esgoto, adubo, embalagens, telefones, papel, cola, calçados e até copos e xícaras não entram nos territórios ocupados em quantidade suficiente, ou absolutamente não há.

    Conforme relatórios da Oxfam, apenas 137 caminhões com alimentos entraram em Gaza no mês de novembro de 2008. Em média, 4,6 caminhões/dia; em outubro de 2008, entraram em média 123; em dezembro de 2005, 564. As duas principais organizações que levam comida a Gaza são a UNRWA, Agência de Ajuda Humanitária da ONU para os Refugiados Palestinos e o Oriente Médio; e a WFP, "Programa Alimento para o Mundo". A UNRWA alimenta aproximadamente 750 mil palestinos em Gaza (cerca de 15 caminhões/dia de alimentos). Entre 5/11 e 30/11, só chegaram 23 caminhões, cerca de 6% do mínimo indispensável; na semana de 30/11, chegaram 12 caminhões, 11% do mínimo indispensável. Durante três dias, em novembro, a UNRWA esteve totalmente desabastecida – e 20 mil pessoas não receberam a única comida com que contam para matar a fome. Nas palavras de John Ging, diretor da UNRWA em Gaza, praticamente todos os atendidos pela organização dependem completamente do que recebem, seu único alimento. Dia 18/12, a UNRWA suspendeu completamente a distribuição de alimento, dos programas regulares e dos programas de emergência, por causa do bloqueio israelense.

    A WFP enfrenta problemas semelhantes; conseguiu enviar apenas 35 caminhões, dos 190 previstos para atender as necessidades da Faixa de Gaza até o início de fevereiro de 2009 (mais seis caminhões conseguiram chegar a Gaza, entre 30/11 e 6/12). E não é só: a WFP é obrigada a pagar pelo armazenamento dos alimentos que não podem ser enviados a Gaza. Só em novembro, pagou 215 mil dólares. Se Israel mantiver o sítio a Gaza, a WFP terá de pagar mais 150 mil dólares pelo armazenamento dos alimentos, no mês de dezembro, dinheiro que deveria ser usado para auxiliar os palestinos, mas está entrando nos cofres de empresas israelenses de armazenamento.

    A maioria das padarias comerciais em Gaza (30, de 47) foram obrigadas a fechar as portas por falta de gás de cozinha. As famílias estão usando qualquer tipo de combustível que encontrem, para cozinhar. Como a FAO/ONU já informou, o gás é indispensável para manter aquecidos os criadouros de aves. A falta de gás e de rações, já levou à morte milhares de galinhas e frangos. Em abril, conforme a FAO, já praticamente não haverá galinhas e frangos em Gaza – e para 70% dos palestinos, carne e ovos de galinha são a única fonte de proteína.

    Bancos, impedidos por Israel de operar nos territórios ocupados, fecharam as portas dia 4/12. Num deles há um aviso, em que se lê: "Por decisão da Autoridade das Finanças na Palestina, o banco permanecerá fechado hoje, 4/12/2008, 5ª-feira, por falta de numerário. O banco só reabrirá quando voltar a receber moeda."

    O Banco Mundial já antecipara que o sistema bancário em Gaza entraria em colapso se as restrições continuassem. Todo o fluxo de dinheiro para os programas foi suspenso, e a UNRWA suspendeu a assistência financeira a outros subprogramas, para os mais necessitados, dia 19/11. Também está paralisada a produção de livros didáticos e cadernos, porque não há papel, tinta de impressão e cola, em Gaza. Com isso, 200 mil estudantes serão afetados, ano que vem, no início das aulas.

    Dia 11/12, o ministro da Defesa de Israel, Ehud Barak, enviou 25 milhões de dólares para o sistema bancário na Palestina, depois de um apelo do primeiro-ministro palestinense, Salaam Fayad; foi a primeira remessa, desde outubro. Não bastará nem para pagar o mês de salários atrasados dos 77 mil funcionários públicos de Gaza.

    Dia 13/11, foi suspensa a operação da única estação de energia elétrica que opera em Gaza; as turbinas foram desligadas por absoluta falta de diesel industrial. As duas turbinas movidas a bateria 'caíram' e não voltaram a funcionar dez dias depois, quando chegou um único carregamento de combustível. Cerca de 100 peças de reposição, encomendadas para as turbinas, estão há oito meses no porto de Ashdod, em Israel, a espera de que as autoridades da alfândega israelense as liberem. Agora, Israel começou a leiloar as peças não liberadas, porque permanecem há mais de 45 dias no porto. Tudo feito conforme a legislação de Israel.

    Durante a semana de 30/11, 394 mil litros de diesel industrial foram liberados para a estação de produção de energia: aproximadamente 18% do mínimo que Israel está legalmente obrigado a fornecer. Foi suficiente apenas para fazer funcionar uma turbina, por dois dias, antes de a estação ser novamente fechada. A Gaza Electricity Distribution Company informou que praticamente toda a Faixa de Gaza ficará sem eletricidade por períodos que variarão entre 4 e 12 horas/dia. Em vários momentos, haverá mais de 65 mil pessoas sem eletricidade.

    Nem mais uma gota de óleo diesel (para geradores e para transporte) foi entregue essa semana (como já acontece desde o início de novembro); nem de gás de cozinha. Os hospitais em Gaza estão operando, ao que parece, com diesel e gás recebido do Egito, pelos túneis; ao que se diz, são produtos administrados e taxados pelo Hamás. Mesmo assim, dois hospitais em Gaza estão sem gás de cozinha desde 23/11.

    Além dos problemas diretamente causados pelo sítio israelense, há os problemas criados pelas divisões políticas entre a Autoridade Palestina na Cisjordânia e a Autoridade do Hamás, em Gaza. Por exemplo, a CMWU, que fornece água para a região costeira de Gaza, que não é controlada pelo Hamás, é financiada pelo Banco Mundial via a Autoridade Palestina para a Água (PWA) em Ramállah; o financiamento destina-se a pagar o combustível para as bombas do sistema de esgotos de Gaza. Desde junho, a PWA tem-se recusado a liberar o dinheiro, aparentemente porque entende que o funcionamento dos esgotos beneficiaria o Hamás. Não sei se o Banco Mundial tentou alguma intervenção nesse processo, mas, por hora, a UNRWA está fornecendo o combustível necessário, embora não tenha orçamento para essa finalidade. A CMWU também pediu autorização a Israel para importar 200 toneladas de cloro; até o final de novembro recebeu apenas 18 toneladas – suficiente para o consumo de uma semana de água clorada. Em meados de dezembro, a cidade de Gaza e o norte da Faixa só tinha água por seis horas, a cada três dias.

    Segundo a Organização Mundial de Saúde, as divisões políticas entre Gaza e a Cisjordânia também têm tido sério impacto sobre o abastecimento de remédios em Gaza. O ministério da Saúde da Cisjordânia (MOH) é responsável por comprar e distribuir quase todos os produtos farmacêuticos e cirúrgico-hospitalares usados em Gaza. E todos os estoques estão perigosamente baixos. No mês de novembro, várias vezes o ministério devolveu carregamentos recebidos por via marítima, por não haver espaço para armazenamento; apesar disso, nada tem sido entregue em Gaza, em quantidades suficientes. Na semana de 30/11, chegou a Gaza um caminhão com remédios e suprimentos médios, enviado pelo MOH em Ramállah; foi o primeiro, desde o início de setembro.

    Está acontecendo aí, ante nossos olhos, a destruição de toda uma sociedade – e nenhum clamor se ouve, além dos avisos da ONU, que são ignorados pela comunidade internacional.

    A União Européia anunciou recentemente que deseja estreitar relações com Israel, pouco depois de as autoridades israelenses terem declarado abertamente que preparam a invasão, em larga escala, da Faixa de Gaza e de terem apertado ainda mais o bloqueio econômico, com o apoio, já nada tácito, da Autoridade Palestina em Ramállah. Essa, vê-se, está colaborando com Israel, em várias medidas. Dia 19/12, o Hamás deu oficialmente por encerrada a trégua (que Israel declarou que estaria interessado em renovar), porque Israel não suspendeu (nem diminuiu) o bloqueio.

    Por quê, como, em que sentido, negar alimento e remédios à população de Gaza ajudaria a proteger os israelenses?

    Por quê, como, em que sentido, o sofrimento das crianças de Gaza – mais de 50% da população são crianças! – beneficiaria alguém?

    A lei internacional – e a decência humana – exigem que essas crianças sejam protegidas. Se Gaza cair, cairá depois, a Cisjordânia.


    * "If Gaza falls...", Sara Roy, London Review of Books, 1/1/2009, em http://www.lrb.co.uk/v31/n01/roy_01_.html © LRB. Tradução de Caia Fittipaldi, sem valor comercial, para finalidades didáticas.

    ** Professora do Harvard’s Center for Middle Eastern Studies. Autora de Failing Peace: Gaza and the Palestinian-Israeli Conflict.

    As fotos da morte e destruição em Gaza foram extraídas de: Guardian

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