O texto de hoje é de Gabriel Perissé, autor dos livros Elogio da leitura e Literatura & educação. Professor do programa de mestrado em Educação da Uninove (SP).
Um editor carioca me contava, recentemente, que muitos professores universitários dirigem-se à editora pedindo livros de graça, a título de cortesia. Alegam que são professores, portanto, multiplicadores, divulgadores em potencial, pois pretendem fazer “propaganda” entre os colegas e os alunos. Sim, nós professores merecemos ganhar livros, mas devemos ser sinceros. Na verdade, pouco podemos multiplicar.
O triste fato: os docentes têm dificuldade para comprar um livro de R$ 40,00. Mesmo os mais baratos podem nos parecer caros, quando, como diz um humorista, falta tanto mês no final do salário. E em nossas aulas podemos até elogiar e recomendar livros, mas os alunos (em particular os universitários), quando compram, levam os livros mais baratos, e tão-somente se não encontram exemplares disponíveis na biblioteca ou não conseguem xerocopiá-los clandestinamente.
Início do ano letivo... bem-aventurados aqueles cujos nomes aparecem como autores de livros didáticos, compra obrigatória para os pais cujos filhos freqüentam escolas particulares. Livros didáticos, bem sabemos, que nascem do trabalho de uma equipe editorial, é um investimento grande para ajudar os docentes do País a vencerem incertezas e hesitações. Uma pesquisa demonstra que muitos professores lêem apenas o próprio livro didático ao prepararem suas aulas. Não criam seus próprios exercícios e atividades. Não se arriscam.
Na Folha de S. Paulo (26/01/07), o imortal José Sarney fez a sua apologia ao livro, um tanto hiperbólica: “O aquecimento global pode levantar o nível dos mares e a água invadirá as cidades, mas salvaremos os livros, se não pudermos salvar os prédios das bibliotecas.” Menciona “um projeto, já sancionado, do Estatuto do Livro e outro para a criação de um fundo para a difusão da leitura e a proteção ao livro.” Trata-se da Lei n° 10.753, de 2003. Ela é cheia de boas intenções, como deve ser toda a lei que se preza.
Mas, como sempre, não é com decretos que se muda a realidade. Mais da metade dos professores brasileiros – ou seja, mais de 1 milhão e 500 mil professores – não têm o hábito da leitura (segundo o Instituto Paulo Montenegro). Nemo dat quod non habet, ninguém dá aquilo que não tem. Nossos alunos – cerca de 50 milhões de pessoas estão estudando hoje no Brasil – vêem boa parte de seus professores carentes da paixão pela leitura. Educadores que não lêem têm repertório limitado, vocabulário pobre, imaginação rotineira. Seus alunos, por osmose, não escapam dessas limitações. Estas atrofiam nossa existência.
Em algum lugar do futuro, secretários de educação e donos de escolas criarão o vale-livro para docentes. Cada professor poderá gastar R$ 40,00 por mês (ou mais, dependendo do seu esforço e do seu desempenho) em livrarias, feiras de livros, sebos. E se ele for diretamente a uma editora poderá conseguir descontos de 20%, ou mais. Bolsa-livro para o docente estudar, aprender, aprofundar-se, entusiasmar-se, montar a sua biblioteca pessoal.
Contudo, simplesmente esperar por esse incentivo é condenar-se à apatia. Professores sem leitura? Educação sem cura. Portanto, cada professor, cada professora, por terem o dever de transmitir a “dor da lucidez”, como diz o personagem/professor do excelente filme argentino Lugares comunes, são chamados, por uma questão de responsabilidade pessoal, a buscar alternativas inteligentes para si e para os alunos.
Se as editoras, que também enfrentam dificuldades para divulgar e vender seus livros, não podem doá-los, cabe-nos sermos criativos! Na sua escola, bairro ou cidade, os professores podem fundar bibliotecas populares, sistemas de empréstimo/rodízio de livros, enfim, pôr em prática soluções novas, com iniciativa corajosa!
E você professor/a, concorda com Perisse? Comente.
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