Quem fez a História em Projetos?
Somos autoras cujo encontro social se deu pelo acesso à educação pública e qualitativa. Foi esse acesso que nos permitiu fugir das estatísticas de exclusão e marginalização social. Essa experiência nos moveu a assumir desde cedo compromissos com o ensino de nosso país e a nos envolver com experiências educacionais diferenciadas: educação de crianças, adolescentes, jovens e adultos, formação de professores, ensino universitário, educação junto aos movimentos sociais e produção de diferentes materiais didáticos, voltados para diferentes níveis de ensino.
Nossa proposta pedagógica, concretizada nesta Coleção, que agora apresentamos, traz a marca de nossas experiências de vida e de nossas atividades profissionais e, certamente, foi inspirada pelo valor que atribuímos à educação.
Com o apoio dela, desejamos que seu percurso de descobertas e diálogos, estabelecido conjuntamente com seus alunos, seja tão agradável e rico como foi nossa jornada ao elaborá-la. Desejamos igualmente que, como nós, seus alunos conquistem o fundamental direito de serem educados para a cidadania, para o respeito a si próprios e aos demais e possam percorrer prazerosamente o caminho da construção do conhecimento, descobrindo quanto ele pode ser transformador de nós mesmos e, assim, habilitando-nos para transformar o mundo.
Qual a nossa proposta pedagógica?
Uma jornada para toda a vida: educar, aprender e respeitar as diferenças
O poeta, educador e antropólogo Carlos Rodrigues Brandão, trabalhando com as contribuições de Paulo Freire, convida-nos a refletir sobre a vocação humana para a aprendizagem infinita, sem razões e fins unicamente utilitários. Para Brandão, o saber individual guardado para si é um anti-saber, não propicia uma educação verdadeira, libertadora, inclusiva, emancipatória, humanista. Assim, segundo o autor:
“[...] Quando [o ser humano] sabe e ensina o saber, é sobre e através das relações de objetos, pessoas e idéias que ele está falando. E é no interior da totalidade e da diferença de situações através das quais o trabalho e as trocas de frutos do trabalho garantem a sobrevivência, a convivência e a transcendência que, no interior de uma vida coletiva anterior à escola, mas plena de educação, os homens entre si se ensinam-e-aprendem. Ao mesmo tempo que socialmente a educação, um domínio da cultura entre outros, é condição da permanente recriação da própria cultura, individualmente a educação, uma relação de saber entre trocas de pessoas, é condição da criação da própria pessoa. Aprender significa tornar-se, sobre o organismo, uma pessoa, ou seja, realizar em cada experiência humana individual a passagem da natureza à cultura”.
(Brandão, Carlos Rodrigues. O processo geral do saber (a educação popular como saber da comunidade). In: Educação popular. 1. ed. 1984. São Paulo: Brasiliense, 1997. p. 14-26).
Para nós, é nesse caráter dialógico de partilha e de constantes recriações (na construção de uma prática escolar que possa lidar não apenas com a maior variedade possível de instrumentais, visões e relatos, mas que possa também conseguir avançar na questão da inclusão social/cultural) que reside a grande riqueza da atividade pedagógica. Mas sabemos que, embora prazerosa, a tarefa do/a educador/a é, por vezes, árdua, carregada de incertezas e limitações, exigindo uma abertura ao outro e a seus questionamentos e o abandono de nossas vestes autoritárias e inflexíveis. No exercício de educar é preciso ainda aprender a lidar com universos pessoais tão variados – e por vezes tão conflitantes – e estimular os alunos a vivenciar o cotidiano em sala de aula de maneira positiva, alegre, relacional e afetiva. Assim, diante da diversidade de origens, contextos e formações de alunos e professores, tornar a construção do conhecimento histórico algo mais próximo da vivência das comunidades escolares (ou de suas realidades vividas, termo utilizado nos Parâmetros Curriculares Nacionais – PCNs), cujo produto final possa ser partilhado, constitui não apenas uma meta, mas também um grande desafio que nós educadores não podemos nos eximir de enfrentar.
Em recente compilação de artigos sobre o ensino de História, o historiador José Alves reforça a necessidade da aproximação do ensino de História da vivência dos alunos:
“A busca da compreensão da realidade e a efetiva participação do indivíduo a partir de dados e noções relativos ao seu cotidiano, ao seu universo, fazem com que a escola passe a ser considerada como um espaço de conhecimento e reconhecimento, onde por intermédio das diversas disciplinas e de sua nova abordagem o aluno seja capaz de ver e vislumbrar-se como construtor de sua própria história. Dessa forma, o ensino de História deve atrelar-se aos temas propostos pela comunidade escolar, a fim de se tornar presente e capaz de dizer qual sua função dentro do processo escolar”.
(Freitas Neto, José Alves de. A transversalidade e a renovação no ensino de História. In: Karnal, Leandro (org.). História na sala de aula: conceitos, práticas e propostas. São Paulo: Contexto, 2003. p. 57-74 e 67).
Para nós, o estímulo ao diálogo, à participação livre e espontânea dos alunos, o respeito das singularidades individuais e a aproximação afetiva entre professores e alunos são elementos necessários para tornar a escola um espaço mais democrático, rico e prazeroso. Nessa busca, uma conduta fundamental para os educadores é a de que os seus valores sociais, suas atitudes e opções pessoais sejam esclarecidos para os seus alunos. Mas, antes disso, é fundamental que a construção desses valores e atitudes tenha sido resultado de um esforço pessoal de delimitação e reconhecimento dos seus objetivos e do seu papel como educador/a.
Em nosso trabalho como mestres (que assim nos tornamos, não pelo poder investido institucionalmente, mas porque também fomos aprendizes e igualmente trilhamos o caminho da construção do conhecimento) temos de reelaborar e reinventar caminhos e estratégias incessantemente. A cada turma, a cada ano e a cada desafio somos convidados a essa renovação.
Essa especificidade do educar – a construção permanente dos saberes – alinha-se com os próprios sentidos do “fazer História”, como um ato contínuo de reelaboração. Tal postura não significa eleger uma determinada visão ou versão histórica em detrimento de outras até então hegemônicas. Trata-se de esclarecer que todo ato de interpretação e de leitura do mundo implica uma opção teórica, metodológica, pedagógica e de valorizar o papel do conhecimento histórico na construção das identidades.
É possível que muitas das vertentes teóricas no campo da Educação e da História propostas a você tenham esbarrado nos obstáculos da prática e do cotidiano na sala de aula. Por isso, mais que um receituário ou um compêndio de regras frias, estanques e distanciadas da prática escolar, nesta coleção de História, procuramos apresentar algumas vias que possibilitam ao/à educador/a articular olhares, sentidos e projetos, mediar a renovação constante do diálogo no ambiente escolar, promover o discurso e o sentimento da tolerância social e do respeito às diferenças, testemunhar o fortalecimento e os reconhecimentos de identidades socioculturais, iluminar o percurso crítico dos meandros ideológicos e políticos que constroem mundos, identidades e discursos históricos com pretensões de verdade, universalidade e objetividade.
O que propomos é uma renovação de sua disponibilidade para: – superar os desafios e limites impostos pelas dificuldades diárias da lida pedagógica;
– uma tomada de consciência da constante necessidade de nos adaptarmos às transformações da sociedade; – uma atenção especial à postura de nossos alunos e às mudanças de nossas próprias expectativas e perspectivas como educadores.
Nossa proposta pedagógica enfatiza as discussões relativas aos valores democráticos: cidadania, respeito às diferenças, respeito e garantias das liberdades individuais, promoção da igualdade de condições socioculturais e do pensamento autônomo, crítico e libertário. Para isso fizemos uso dos temas transversais propostos pelo MEC para essa fase escolar, a saber: ética, meio ambiente, orientação sexual, pluralidade cultural, saúde, trabalho e consumo.
Consideramos também a Lei 10 639/03 e suas Diretrizes.
Por meio das temáticas desenvolvidas e das atividades sugeridas ao longo de cada livro desta Coleção, procuramos estimular a construção de conhecimentos de feições democratizantes, visando romper com a exclusão social e cultural e com as visões de mundo estereotipadas pelo exercício da alteridade. Nosso objetivo é que a percepção do processo de construção desses discursos torne-se, então, um instrumento de inteligência crítica, criativa e inclusiva.
Almejamos, ainda, que nosso projeto pedagógico auxilie a sua prática escolar a se tornar o lócus privilegiado não de aplicação de um conjunto de saberes, mas de uma série de atos de criação, os quais, em movimento, possam criar um novo produto ampliado e adequado à realidade de cada escola. Assim, em cada atividade e/ou projeto proposto e executado, desejamos que o processo e as realizações dos alunos nele envolvidos tornem-se de fato o conteúdo pedagógico mais importante e rico para o aprendizado.
Como está organizada nossa coleção?
Rotas e atalhos para uma viagem por diferentes tempos e espaços: as seções dos capítulos da Coleção
A fascinação pelo espírito de aventura, as descobertas e os desafios de uma viagem fazem parte do imaginário das crianças e adolescentes e são exercitados continuadamente, seja pela leitura de história sem quadrinhos ou livros de aventura, seja pelas possibilidades interativas dos modernos games de ação. Nossa Coleção de História, elaborada em quatro livros, cada qual com unidades temáticas subdivididas em capítulos, destinada aos alunos do 3º- e 4º- ciclos do Ensino Fundamental, tem como mote o convite a uma viagem pela História. Não se trata, entretanto, de propor uma viagem no tempo como se possível fosse colocarmo-nos como sujeitos de determinada realidade histórica e, assim, melhor compreendermos seus contextos e mentalidades.
A interação que desejamos despertar nos alunos com nossa proposta pedagógica é a do processo de construção e reelaboração dos discursos do passado, assim como a compreensão das incalculáveis mediações do “fazer histórico” impostas, por exemplo, pela disponibilidade e pelas limitações das fontes textuais, orais e imagéticas; pelos pressupostos epistemológicos e escolhas/recortes do/a pesquisador/a-historiador/a; ou seja, pela constatação de que a realidade histórica que supostamente pretendemos abarcar ou reconstruir nos escapa.
Assim, como em qualquer viagem, as nossas impressões e aquilo que podemos visualizar são apenas uma parte de uma realidade mais ampla e diversificada. Desse modo, organizamos as unidades temáticas a partir de determinadas problemáticas e conceitos que fazem parte das discussões historiográficas atuais, mas tal organização e recortes visam também estimular a construção de ricas relações com a realidade cotidiana dos alunos e da comunidade escolar.
Esses conteúdos pretendem construir uma visão histórica mais ampla, que inclui a abordagem:
– da dimensão social dos processos históricos (os modos de vida, as técnicas e a vida material, as condições de trabalho, as conjunturas econômicas);
– da dimensão cultural (crenças, vida cotidiana, rituais, expressões artísticas);
– dos diálogos interdisciplinares no campo da matemática, da geografia, da língua portuguesa, das artes, das ciências naturais.
Os livros desta Coleção têm também um nível cronológico de organização dos seus conteúdos.
O livro de 5ª- série foca algumas das primeiras comunidades humanas em diferentes continentes e destaca o que os historiadores ocidentais convencionaram denominar de Antiguidade e Idade Média. Mas, afastando-nos de coleções de História integrada que costumeiramente privilegiam um recorte eurocêntrico, nossa Coleção busca ir além da Antiguidade clássica e de um orientalismo construído sob a lógica do Ocidente. Nela, os alunos se depararão com:
– a abordagem da sociedade indiana, em que se procura entender a formação e a duração da sociedade de castas;– o destaque à importância da cultura e do letramento para o funcionamento da burocracia imperial chinesa da Antiguidade;
– os saberes e técnicas construídos no Egito africano;– a relação entre rituais religiosos e o fortalecimento do poder na Mesopotâmia;
– a visão da Palestina dos hebreus e outros povos;– a visão do império Persa antes e depois dos gregos, etc.
A seleção de conteúdos do livro de 6a série, cujo recorte cronológico se concentra entre os séculos XVI e XVIII, dedica-se à análise da dinâmica das relações de poder, do contexto sociocultural e das relações de trabalho e econômicas nos continentes americano, africano, asiático e europeu, a partir do empreendimento das Grandes Navegações. Os alunos poderão comparar as grandes transformações ocorridas a partir da ampliação de contatos entre os diferentes povos dos continentes americano, africano e asiático e os povos do continente europeu. Contatos que, na maioria das vezes, foram estabelecidos pela força, mas mesmo assim foram transformadores em diferentes níveis: de relações sociais, econômicas, culturais e políticas.
O livro de 7a série parte do século XVII, com a Revolução Inglesa, e avança até fins do século XIX. Destaca as revoluções liberais, os movimentos de independência latino-americanos, discute ainda as unificações italiana e germânica, assim como se aprofunda no contexto brasileiro, buscando investigar as relações estabelecidas entre o Estado monárquico e a sociedade, articularmente entre aqueles considerados cidadãos e os demais homens livres pobres e escravizados, e se encerra analisando a abolição legal da escravatura no Brasil.
O livro de 8a série inicia-se com o estabelecimento da república conservadora e excludente no Brasil e se dedica a examinar o século XX globalmente, sem deixar de lado a história do Brasil e sem abandonar as temáticas importantes que elegemos para desenvolver ao longo de toda a Coleção, entre elas as relações de trabalho, as relações sociais, a participação política, a cultura, as identidades, etc. Finalizamos esse livro com um capítulo dedicado à juventude brasileira, focando sua participação política, os problemas que a afetam, suas perspectivas e esperanças para o século XXI. Como já anunciamos anteriormente, em cada capítulo, unidade e livro desta Coleção, buscamos enfrentar os desafios impostos aos autores didáticos na era midiática, combinando o aprofundamento da análise com o poder de síntese, com apoio na variedade de documentos selecionados, dando sentido aos eixos temáticos das unidades que compõem cada livro, fazendo uso de periodizações clássicas sem, no entanto, reduzir o ensino da História a uma perspectiva teleológica.
Assim, os livros, as unidades, e os capítulos desta Coleção foram redigidos para que sua leitura se efetive como um passeio interessante, instrutivo e enriquecedor pela história de diferentes povos em diferentes tempos e espaços. Nesses deslocamentos, sua função mediadora, professor/a, auxiliará os alunos a transportar suas emoções e certezas para lugares inesperados e desconhecidos, exercitando a capacidade do deslumbramento e também da empatia. Sensação primordial e exercício necessário para a construção das visões de mundo dos estudantes, para o aprimoramento da leitura crítica da realidade em que vivem e, principalmente, para que construam e desenvolvam os valores do respeito às diferenças.
Assim, os alunos são estimulados não apenas a descobrir, mas, principalmente, a construir suas impressões de viagem durante todo o percurso desenvolvido em cada capítulo, nas suas diferentes seções, por meio das leituras propostas de textos de época, fotografias, letras de música, ilustrações, propagandas, mapas, tabelas, trechos literários, científicos, jornalísticos, etc.
O objetivo é que os alunos – ao observar, ler e analisar essa grande diversidade de fontes, comparando-as, extraindo delas informações, refletindo sobre elas, tecendo relações com a sua história presente – experimentem um pouco do ofício dos historiadores e, assim, compreendam paulatinamente como a história dos acontecimentos passados é construída e reconstruída e em que bases e com quais ferramentas e habilidades se dá essa construção/reconstrução.
Nesse trajeto de temporalidades intercruzadas, os alunos são estimulados a desvendar os jogos de poder, as estratégias de sobrevivência, as negociações e conflitos, as fantásticas criações no campo das artes e das ciências, a historicidade de conceitos/temas e, sobretudo, a multiplicidade e a mutabilidade de saberes construídos por meio dessa variedade de fontes históricas.
O mote da viagem pode ser associado não apenas ao deslocamento dos alunos por temas, paisagens e temporalidades diversas, mas também à construção, elaboração e busca das noções de pertencimento e de identidade com espaços territoriais, culturais e sociais.
Essa transitoriedade do/a aluno/a-viajante é o ponto de passagem para o entendimento da transitoriedade dos saberes. Os alunos por diversas vezes são convidados a exercitar alguns procedimentos de análise historiográfica ao mesmo tempo que se revela que o conhecimento histórico é uma construção provisória e passível de novas interpretações.
A sua sensibilidade, professor/a, será importante para prolongar o tempo destinado a determinado capítulo, de acordo com a potencialidade do tema, o interesse dos alunos ou a adequação a algum acontecimento local e/ou nacional vivido no momento em que o capítulo está sendo desenvolvido. Além disso, aos cenários propostos você poderá acrescentar as sensibilidades e as impressões dos alunos, costurando os resultados e os sentidos das leituras realizadas.
Conheça agora as seções que compreendem cada capítulo da Coleção:
Nosso itinerário
“Antes de sair de casa
aprendi a ladainha
das vilas que vou passarna minha longa descida.
Sei que há muitas vilas grandes,
cidades que elas são ditassei que há simples arruados,
sei que há vilas pequeninas,todas formando um rosário
cujas contas fossem vilas,de que a estrada fosse a linha.
Devo rezar tal rosário
até o mar onde termina,saltando de conta em conta,
passando de vila em vila.
Vejo agora: não é fácil
seguir essa ladainhaentre uma conta e outra conta,
entre uma e outra ave-maria,há certas paragens brancas,
de planta e bicho vazias,vazias até de donos,
e onde o pé se descaminha.[...].
Pensei que seguindo o rio
eu jamais me perderia:ele é o caminho mais certo,
de todos o melhor guia.Mas como segui-lo agora
que interrompeu a descida?[...].
Tenho que saber agora
qual a verdadeira viaentre essas que escancaradas
frente a mim se multiplicam.Mas não vejo almas aqui,
nem almas mortas nem vivasouço somente à distância
o que parece cantoria.
Será novena de santo,
será algum mês-de-Mariaquem sabe até se uma festa
ou uma dança não seria?”Melo Neto, João Cabral de. Morte e vida severina e outros poemas para vozes. 34. ed. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1994. p. 33-4.
Como o próprio nome revela, nesta seção de abertura de cada capítulo são traçadas o que denominamos rotas ou roteiros de viagem, para explorar as temáticas que serão desenvolvidas ao longo do capítulo. Nela fornecemos algumas pistas sobre o tempo e o espaço que serão estudados e algumas das principais questões que serão abordadas ao longo das demais seções.
A título de exemplo, consulte a seção Nosso itinerário da página 7 do livro de 5a série; da página 170 do de 6a série; da página 231 do de 7a série; e da página 119 do livro de 8a série. Propomos um percurso interativo, que não se objetiva linear e estático, abrindo-se a possibilidade de você, professor/a, intercambiar significados e incluir outros caminhos surgidos na prática escolar e dos seus interesses, como guia e companheiro dessa viagem.
Ponto de partida
O Ponto de partida traz algumas referências que existem em nosso tempo presente sobre algum dos aspectos das temáticas desenvolvidas ao longo de cada capítulo.
As atividades desta seção têm o objetivo de avaliar os conhecimentos prévios – a bagagem – do/a aluno/a – viajante em relação aos conceitos, conteúdos e principais problemáticas abordadas ao longo do capítulo. Entretanto, faz-se necessária uma reflexão: precisamos reconhecer nossos alunos como sujeitos inscritos no processo histórico, imbuídos de memória e cultura, e não entendê-los como “produtos naturais” de seu meio. Como sujeitos históricos e sociais, eles desenvolvem conhecimentos prévios sobre o mundo, construídos em suas relações familiares, comunitárias, civis e/ou religiosas, e/ou adquiridos por meio de diferentes suportes e mídias. Ou seja, tais conhecimentos são, em grande medida, resultado de um processo coletivo e social e não devem ser reduzidos a produtos de um processo individual e/ou psicológico.
Para nós, tais conhecimentos devem ser considerados no processo de construção dos conceitos. Devemos aceitá-los não simplesmente para pô-los à prova – ao testar as hipóteses iniciais dos alunos para que ao final sejam capazes de formalizar os conceitos nos padrões cientificamente aceitos como corretos –, pois, desse modo, os conhecimentos prévios de nossos alunos, depreciados e negados por nós, serviriam apenas para confrontação com os conhecimentos cientificamente aceitos. Como nos alerta Maria Paula Adinolfi, fazendo uso das reflexões de Geertz:
“[...] visto fundamentalmente como errado ou insuficiente, levado em conta somente como um degrau para atingir o verdadeiro conhecimento, representado pela ciência. [...], o senso comum não é reconhecido como sistema cultural, construído historicamente a partir de reflexões deliberadas sobre a experiência e passível de análise e interpretação como fenômeno social (Geertz, 1994:95-96). Faz-se necessária, assim, uma reflexão, não apenas sobre os ‘conhecimentos prévios’ e o senso comum dos alunos, mas também sobre o que o senso comum dos professores lhes informa sobre os tais conhecimentos prévios”.
(Adinolfi, Maria Paula Fernandes. A África é aqui: Representações da África em experiências educacionais contra hegemônicas na Bahia, dissertação de mestrado apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social, sob orientação do Prof. Dr. Carlos Moreira Henriques Serrano, USP, FFLCH, Departamento de Antropologia, São Paulo, 2005, p. 203)
Buscando evitar esse reducionismo, que, por vezes, nos impede de perceber a identificação dos conhecimentos prévios com a cultura do grupo ou da sociedade à qual nossos alunos pertencem, as atividades desta seção estimulam a exposição de idéias e de impressões, seja realizada individualmente, seja em duplas, seja em grupo, objetivando a leitura atenta de imagens e/ou textos, associadas a pesquisas, entrevistas e debates com os seus colegas e com o/a professor/a.
A título de exemplo, veja algumas das atividades propostas para essa seção nas páginas 2-23 do livro de 5a série; nas páginas 145-146 no de 6a; na página 68 do livro de 7a; e nas páginas 184-185 do livro de 8a.
Esses exercícios e as interpretações propostas estarão presentes ao longo de todo o capítulo, mas é bom lembrar que, se a motivação essencial do/a viajante é a abertura de horizontes, o contato com diferentes realidades e bens materiais e imateriais e o despertar de novas sensibilidades diante de territórios desconhecidos, tal abertura só se realizará com a disposição dos indivíduos para a reflexão.
Assim, se almejamos estimular o olhar de nossos alunos para o exercício de alteridade e para o abandono das bagagens empoeiradas de preconceitos, anacronismos e do que chamamos de perpetuação de “ruínas teóricas”, igualmente devemos nos despir de nossas “verdades” construídas sobre as percepções de nossos alunos e, ao reconhecê-las e reconhecer as “verdades” construídas por eles, juntos, poderemos refletir sobre a historicidade dessas visões de mundo e quiçá transformá-las.
Orientando-se no tempo e no espaço e Panorama
A seção Orientando-se no tempo e no espaço, com apoio em mapas e documentos escritos e/ou imagéticos associados ao quadro cronológico presente na seção Panorama, tem múltiplos objetivos e funções.
A sistematização dos recortes cronológicos visa auxiliar os alunos a se localizarem no tempo e no espaço do período ou dos períodos abordados no capítulo e, ao mesmo tempo, problematizar/esclarecerem alguma medida a construção das periodizações pelos historiadores.
De modo geral, estimulamos os alunos a entender, a partir da breve síntese dos acontecimentos destacados na seção Panorama, o que revelam ou omitem tais recortes e a refletir sobre eles. Assim, nossos quadros cronológicos ressaltam os fatos tradicionalmente apontados em outras coleções didáticas, mas também, por meio de exercícios propostos, criamos alguns ruídos nos recortes tradicionais, desvelando para os alunos que a periodização é uma construção, e que, portanto, pode ser feita de inúmeras maneiras e, igualmente, revelar inúmeras leituras do presente sobre o passado. Como exemplo, consulte no livro de 5ª série as atividades 4 a 6 (p. 39-41); no de 6a as atividades 2 a 7 (p. 79-81); no de 7a as atividades 3 a 10 (p. 248-251); e no de 8a a atividade 5 (p. 23).
A utilização de mapas, imagens, tabelas e gráficos presentes nesta seção dá continuidade ao trabalho de leitura e investigação de diferentes suportes documentais, cuja função vai além da mera ilustração do conteúdo proposto, pois objetiva desenvolver e aprimorar a habilidade de leitura de mapas, gráficos e tabelas de modo contextualizado. O quadro cronológico, os mapas e demais fontes destacados nesta seção, combinados aos exercícios, estimulam a integração da História com outras áreas do conhecimento (como as questões pertinentes ao meio ambiente, os estudos geológicos, arqueológicos, biológicos, etc.) e também visam desenvolver habilidades para o aprendizado da História e de outras disciplinas nestes ciclos, como a leitura cartográfica e de dados estatísticos e econômicos. Enfim, à maneira de um guia de viagem, alunos e professores podem recorrer a estas seções em qualquer momento do percurso, sob novas perspectivas e inquirições.
As Paradas“Há uma idade em que se ensina o que se sabe, mas vem em seguida outra, em que se ensina o que não se sabe: isso se chama pesquisar.” Barthes, Roland. Aula(pronunciada dia 7 jan. 1977). Tradução e posfácio de Leyla Perrone-Moisés. 11. ed. São Paulo: Cultrix, 1977. p. 47.
Variáveis em número, dependendo da necessidade de aprofundamento da temática estudada, as Paradas são os espaços onde escolhemos discutir, aprofundar e relacionar conceitos centrais que consideramos importantes.
Por meio de uma seleção cuidadosa de diferentes fontes, que de modo geral sobrepõem diversas informações, e de atividades de observação, leitura e análise, os alunos são estimulados a desenvolver suas habilidades de leitura, escrita e expressão oral, a trabalhar de modocoletivo, a sistematizar suas idéias e a comunicá-las aos demais.
Atividades criativas foram elaboradas para que os adolescentes, bem orientados por você, professor/a, possam ser partícipes de seu processo de aprendizagem, construindo ricas relações entre os principais conceitos do capítulo e, por vezes, entre as temáticas presentes em outros capítulos da Coleção. Assim, durante as Paradas, os alunos são convidados, em diversos momentos, a exercitar seus conhecimentos e, desse modo, ampliá-los ao longo de todo o trajeto. A título de exemplo, examine as atividades 7 a 11 da Parada 1 (p. 86-87), no livro de 5a série; a atividade 13 da Parada 3 (p. 58-59), no de 6a série; as atividades 8 e 9 da Parada 3 (p. 101-103), no de 7a; as atividades 15 e 16 da Parada 2 (p. 101-102), no de 8a série.
Nesses lugares (re)visitados é importante incentivar seus alunos a registrar suas impressões, observações, pesquisas e conclusões.
Tal prática objetiva que eles, de modo individual e coletivo, construam os seus relatos de viagem, façam conexões com outros territórios do saber e tenham condições de transmitir as suas experiências e interagir com seus companheiros.
Ponto de chegada: projeto
“O bom do caminho é haver volta.
Para idas em vinda basta o tempo.”
Fala de Curozero Muando. In: Couto, Mia. Um rio chamado tempo, uma casa chamada terra. São Paulo: Companhia das Letras, 2003. p. 123.
Nesta seção, ao final de cada capítulo, os alunos realizarão um pequeno projeto, organizado em pelo menos três etapas, elaborando um produto final como meio de:
– dar sentido ao que desenvolveram ao longo das demais seções;
– interagirem mais com o conteúdo estudado
– socializarem os resultados com os outros grupos de alunos e/ou com a própria comunidade escolar;
– ampliarem o conteúdo desenvolvido ao longo do capítulo, seja com questões pertinentes ao presente, seja com o aprofundamento das pesquisas documentais.
Nas diferentes etapas propostas, sempre valorizando a produção coletiva, os alunos são estimulados a produzir mapas, realizar entrevistas, fazer pesquisas temáticas e debates, elaborar painéis, montar exposições, redigir livros e outros suportes, fazer apresentações orais, visitas a museus, arquivos e organizações comunitárias, etc. Entre os projetos propostos nessa seção, consulte por exemplo o da página 120 do livro de 5a série; da página 63 do livro de 6a série; das páginas 197-198 do livro de 7a série; e da página 62 do de 8a série.
Assim, a seção Ponto de chegada: projeto constitui-se no momento do “retorno a casa”, da fixação necessária, da sistematização e socialização do aprendizado realizado ao longo do percurso.
Nesse momento ganham significado as anotações de sínteses registradas no caderno, nesta proposta pedagógica entendidas como um diário de bordo, e os procedimentos de pesquisa, vistos não como uma coleta mecânica e sem propósito de dados, mas valorizados como uma aventura que pode revelar dados surpreendentes, mudar o nosso percurso, tema e até mesmo objeto de estudos.
Para realizar as etapas propostas nesta seção, mais do que nunca sua mediação é necessária, estimulando os alunos a incorporar os procedimentos de pesquisa desde os mais simples, como anotar todos os dados da fonte consultada (vide modelos de fichas na p. 13), até os mais elaborados, como pôr em xeque a autoria de uma dada fonte, discutir uma fotomontagem fabricada com propósitos de registro da realidade, etc.
Vale a pena lembrar que, mesmo um pequeno projeto desenvolvido no âmbito escolar necessita de sua mediação, no intuito de antecipar e resolver pequenos problemas em relação a, por exemplo, materiais a serem adquiridos para uma oficina ou para a montagem de uma exposição, agendamento de visitas de lideranças comunitárias, religiosas, políticas, sindicais para debater com os alunos ou para que estes possam entrevistá-los, levantamento prévio de possíveis locais para encontrar fontes específicas, etc.
Para nós são inúmeras as vantagens do trabalho coletivo bem orientado, pois, nesse processo, efetiva-se, de modo significativo, a socialização do conhecimento e das produções dos alunos para os demais grupos. Ao apreciar e valorizar suas realizações e a dos colegas ou ao extrapolar seus produtos para a comunidade escolar e para o seu entorno, os alunos encontrarão um fim social para a sua produção, verão reconhecidos seus esforços no desenvolvimento de cada etapa e aumentarão sua auto-estima e sua satisfação na construção do conhecimento. O projeto executado de modo coletivo, no qual os estudantes tenham suas habilidades e seus esforços pessoais respeitados, auxilia, ainda, no desenvolvimento de valores de cooperação, responsabilidade, cumprimento de prazos, etc.
Temos clareza de que as especificidades de sua comunidade escolar exigirão adaptações, mas reforçamos a importância da realização de alguns projetos propostos. Desse modo, consideramos fundamental que você conheça a proposta sugerida para cada projeto antes do início dos trabalhos em sala de aula para adaptar (se necessário) as propostas e/ou etapas ao contexto de seus alunos, para selecionar e priorizar aqueles mais significativos ao seu grupo de alunos e dedicar o tempo necessário ao seu desenvolvimento.
Finalmente, esclarecemos que, dadas as especificidades das propostas de cada projeto, os objetivos serão apresentados nas orientações para cada capítulo, assim como alguns procedimentos metodológicos para o desenvolvimento das etapas. Mas de modo geral os produtos finais propostos foram pensados para que, com sua mediação, a realização deles seja possível em diferentes comunidades escolares.
Reforçando o que foi dito acima, em função do tempo disponível ao longo do ano letivo, deixamos claro que cabe a você, professor/a, decidir quais projetos podem ser desenvolvidos com mais proveito. Entendemos que a execução deles pode ser inclusive dividida em diversos grupos, cada um deles executando um dos projetos e apresentando seus resultados ao restante da classe.